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26 de Abril de 2024

A concretização de direitos sociais pelo Judiciário

Publicado por Consultor Jurídico
há 12 anos

O problema

Desde a sua inserção dos textos constitucionais, como se sabe, os direitos fundamentais sociais (saúde, educação, trabalho e moradia, para ficar nos exemplos mais conhecidos) têm sido alvo de sérias e numerosas objeções, que têm origem nos mais variados territórios da teoria e da prática jurídica [1].

Em primeiro lugar, lembra Robert Alexy, critica-se nos direitos fundamentais sociais o fato de não se alcançar a partir do próprio Direito fornecer com suficiência critérios racionais para a determinação da extensão e do seu conteúdo (em que consiste e qual a extensão, por exemplo, de direitos como saúde, educação, trabalho e moradia?). Como consequência, afirmam os críticos, a decisão sobre o âmbito de proteção dos direitos fundamentais sociais seria nitidamente uma matéria reservada à Política [2].

Além disso, já agora no âmbito das competências constitucionais, como objeção de ordem formal, afirma-se, grosso modo, que a exigência de uma concretização judicial dos direitos fundamentais sociais implicaria a assunção pelo Poder Judiciário especialmente, a jurisdição constitucional de parte essencial da política orçamentária do Estado, tarefa, como se sabe, da mesma forma, eminentemente política.

Essa indevida transposição de planos e de competências, aliás, como facilmente se percebe, acabaria se concretizando em relevante colisão de normas constitucionais, travadas, de um lado, por normas de direitos fundamentais sociais, e, de outro, pela afirmação do princípio da separação de poderes e da legalidade orçamentária.

Em outros termos, os direitos fundamentais sociais exigiriam para a sua concretização por via judicial a desconsideração pelo Poder Judiciário, de forma tópica ou abstrata, do princípio da separação de poderes, já que, em primeiro lugar, cumpre ao Poder Legislativo e ao Executivo a implementação de políticas públicas. Além disso, a concretização direta pelo Poder Judiciário implicaria óbvia preterição do princípio da legalidade orçamentária, ao se consentir com decisões judiciais que podem adjudicar prestações materiais [3] ao indivíduo (por exemplo, no âmbito da saúde pública, a outorga de medicamentos e ou intervenções cirúrgicas de alto custo) sem previsão orçamentária.

Do ponto de vista substancial, ainda segundo os críticos, a objeção que se pode lançar contra os direitos fundamentais sociais é a de que esses direitos não conseguem se realizar sem manifestarem colisão com outras normas constitucionais garantidoras de direitos e liberdades fundamentais (propriedade, liberdade de iniciativa, liberdade de mercado). Portanto, só com acentuada restrição à propriedade, à livre iniciativa e à liberdade contratual, por exemplo, é que se pode dar concretização a direitos sociais como saúde, educação e trabalho.

Assim, a tese central deste artigo é a de sugerir o princípio da proibição da insuficiência como um instrumento de racionalização do discurso de afirmação e concretização dos direitos fundamentais sociais, de tal ordem que a sua implementação direta não arraste o Poder Judiciário a uma luta essencialmente irracional que se trava no âmbito da arena política.

Da vinculação dos poderes públicos aos direitos fundamentais sociais

Como se sabe, da qualidade jurídico-objetiva dos direitos fundamentais deve-se deduzir não apenas, como parece óbvio, a obrigação de o Estado omitir-se de indevidas intervenções e restrições diretas nos bens e liberdades protegidas pelas normas de direitos fundamentais, mas, mais do que isso, dela derivam o dever de se proteger os bens e liberdades jusfundamentais diante de intervenções ilícitas por parte de pessoas e organizações não estatais [4], assim como resultaria da conformação mesma de alguns direitos fundamentais o dever do Estado a prestações fáticas aos titulares desses direitos. Nomeadamente no caso dos direitos fundamentais sociais derivariam verdadeiros direitos subjetivos à proteção e a prestações fáticas por parte do Estado. As consequências jurídicas daqui resultantes são consideráveis.

Em primeiro lugar, dessa localização no âmbito dos direitos fundamentais sociais do dever de proteção e prestação por parte do Estado resultam vinculados, ante o princípio da supremacia da Constituição, todos os poderes do Estado, isto é, não apenas o legislador pela lei que produz, como também o Poder Executivo e Judiciário, quando, no exercício de suas funções precípuas, editam, respectivamente, atos administrativos ou jurisdicionais [5].

A vinculação do legislador a esse dever de proteção e prestação tem o inafastável significado de uma considerável restrição ao seu espaço e à sua liberdade de conformação legislativa, especialmente onde cuidar-se de proteger e assegurar os bens e liberdades fundamentais diante da intervenção de terceiros [6].

A vinculação da Administração (Poder Executivo) significa uma limitação à sua eventual discricionariedade quando do atendimento e execução de normas garantidoras de direitos fundamentais ou pode obrigá-la a prestar socorro (Hilfe) e proteção (Schutz) diante dos casos concretos.

No caso do Poder Judiciário, essa vinculação aos direitos fundamentais inclui, além de zelar pela obediência às tarefas de proteção [7] por parte dos demais poderes estatais, incumbe-lhe não permitir que fique ao mero arbítrio dos demais órgãos estatais decidir por suficientemente preenchida a tarefa de proteção e de prestação dos direitos fundamentais. Mas, aqui apenas começam os problemas. De um lado, se há um Poder que deve respeitar limites, com certeza, é o Poder Judiciário e, contudo, os direitos fundamentais sociais caracterizam-se comumente por sua indeterminabilidade e uma ausência clara de limites na sua extensão e profundidade; de outro, como se disse anteriormente, não se pode negar que, em qualquer quadrante em que se manifestem, os direitos fundamentais sociais (saúde, educação, trabalho e moradia, para ficar nos exemplos mais conhecidos), dificilmente, alcançarão realização sem colidir com outros direitos, princípios e bens com igual proteção constitucional. Isso explica porque a concretização direta dos direitos fundamentais pelo Poder Judiciário acaba por atrair numerosas objeções, que têm origem nos mais variados territórios da teoria e da prática jurídica. Dessas numerosas objeções, as principiais permitem-se enfeixar em duas espécies de argumentos complexos: um de natureza formal, outro de natureza material.

Colisão de natureza formal (problema de competência) Do ponto de vista formal, as objeções aos direitos fundamentais sociais, segundo correta advertência de R. Alexy [8], acabam nos conduzindo a um verdadeiro dilema, pois, se se afirma que esses direitos sociais são, à semelhança de qualquer ...

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