Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
20 de Abril de 2024
    Adicione tópicos

    CNJ definirá política pública de cotas para o Judiciário

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 11 anos

    Após 500 anos de crimes que abrangem desde serem caçados como animais, retirados de seu núcleo familiar, escravização e holocausto, desapossamento de seus bens, o Conselho Nacional de Justiça escreve uma página que semeia luz no céu cinzento dos que já habitavam o território em que se assenta o Brasil, bem como os sequestrados desterrados da África que para ca conduzidos.

    Em Pedido de Providências instaurado em face do Conselho Nacional de Justiça, Juliene Vieira Lima Fagundes Cunha requer a fixação de diretrizes de políticas públicas para o preenchimento de cargos no Poder Judiciário, com a definição de percentuais para negros e índios, inclusive para os cargos de juiz substituto. Defende as cotas, afirmando que elas não se prestam apenas às ações afirmativas para a questão do acesso a educação, mas também para a inclusão social nos cargos públicos por meio de eleições ou concursos públicos.

    Destaca o julgamento da Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186, ajuizada pelo Partido Democratas (DEM) perante o Supremo Tribunal Federal, cuja decisão foi pela constitucionalidade das cotas raciais em universidades.

    Aduz que houve, no Senado Federal, debate sobre as cotas para negros nos concursos públicos em 27 de março de 2012, acrescentando que quatro estados da Federação adotam as cotas no serviço público, quais sejam, Paraná, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.

    Ressalta ainda que o governo federal, por meio do Decreto 4.228/2002, estabelece o Plano Nacional de Ações Afirmativas na Administração Pública Federal em cargos de livre nomeação.

    Expõe que pessoas negras e indígenas estão mais sujeitas ao desemprego ou ao trabalho informal, bem como a postos de trabalho de menor qualidade status e remuneração.

    Enfatiza entendimento do juiz José Eduardo de Resende Chaves Junior, da 21ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que pondera: "O Conselho Nacional de Justiça não pode continuar a fazer vista grossa para o problema racial no Judiciário. O seu papel de condutor das políticas públicas judiciárias, função que vem desenvolvendo com excelentes resultados concretos, deve ser orientado, o mais rápido possível, a exigir dos tribunais brasileiros a combater de forma positiva, imediata e concreta a odiosa, hedionda e velada discriminação racial."

    Ao final, requer ao CNJ que fixe diretrizes das políticas públicas para o preenchimento de cargos no Poder Judiciário, fixando percentuais para negros e índios inclusive para os cargos de juiz substituto, por evidente, todos os cargos, inclusive terceirizados e em comissão.

    O Conselho Nacional decidiu que é competente para estabelecer as diretrizes do Poder Judiciário para o preenchimento de cargos de juízes substitutos e cargos, efetivos e em comissão, de servidores, estabelecendo reserva de percentual a negros e índios, conforme estudo a ser realizado em 120 (cento e vinte) dias.

    O histórico julgamento estabelece que a desigualdade de oportunidades entre classes sociais, gêneros e raças, em decorrência da discriminação, e notoriamente um problema social de origem histórica no Brasil, e exige, para sua correção, a adoção de ações (políticas públicas) que não se limitam a edição de leis por parte de diversos órgãos e entidades dos setores público e privado, inclusive do Poder Judiciário como parte integrante da Administração Pública, e dentro da sua respectiva atividade administrativa.

    Fundamenta a decisão que é dever do Estado brasileiro, por meio de seus Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), promover e garantir a igualdade material de oportunidades a todas as pessoas, independentemente de origem, idade, sexo, raça ou crença religiosa, uma vez que tal igualdade trata-se de direto fundamental assegurado pela Constituição Federal (art. 5º), bem assim porque constituem objetivos fundamentais da República, entre outros, a construção de uma sociedade justa e solidária, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de todos, sem preconceitos ou quaisquer outras formas de discriminação (art. 3 I III e IV).

    Nessa linha, considerando que a desigualdade de oportunidades também está presente no campo do trabalho, incluído o serviço público, e tendo que conta que cabe ao Conselho Nacional de Justiça, dentro das atribuições que lhe foram outorgadas pela Constituição Federal (art. 103-B), a missão estratégica de definir balizas orientadoras ao Poder Judiciário, para efeito de superação das deficiências verificadas no modelo vigente, e dever do Conselho Nacional de Justiça adotar políticas públicas através de ações afirmativas para a tentativa de correção das desigualdades raciais existentes no serviço público.

    Entendeu que é fundamental, todavia, para a adoção de qualquer medida relacionada ao tema, um estudo aprofundado, haja vista que as proporções a serem observadas ou empregadas no caso concreto tem que se coadunar com as especificidades das composições raciais no Poder Judiciário nacional, bem assim com o tipo e a extensão das desigualdades, para que as medidas que venham a ser tomadas possam conter um planejamento adequado e uma execução que busque efetivamente o equilíbrio das disparidades verificadas.

    O Pedido de Providencias foi conhecido e julgada procedente a preten-são, que será encaminhada a questão à Comissão de Eficiência Operacional e Gestão de Pessoas e a Comissão de Articulação Federativa e Parlamentar. Após estudo, a comissão deve apresentar, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, solução ao Plenário sobre quais medidas administrativas podem ser tomadas no estabelecimento de diretrizes de políticas públicas voltadas ao Poder Judiciário para o preenchimento de cargos de juízes substitutos e cargos, efetivos e em comissão, de servidores, destinando-se percentuais desses cargos a negros e índios.

    O voto do conselheiro relator originário, Jefferson Luis Kravchychyn, é de seguinte teor:

    A questão trazida a este Conselho é relevante e latente no seio da atual conjuntura política brasileira. É que se vê nas ações afirmativas meios de contornar processos excludentes históricos, tal como a da questão racial, indígena, de gênero, entre outros.

    Nesse diapasão, recentemente, o STF, por meio da ADPF 186, julgou improcedente pedido de partido politico que visava a declaração de inconstitucionalidade da política de cotas raciais desenvolvida pela Universidade de Brasília (UnB). Nesse julgamento histórico, em suma, o STF considerou que a citada política de inclusão de negros na UnB atendia ao princípio da igualdade material, na clássica concepção desenvolvida por Aristóteles, em que "devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade".

    Assim, não se discute a constitucionalidade de reserva de vagas para negros e indígenas no acesso a universidades ou ate mesmo a cargos públicos, quando estes exigidos por lei, conforme citado pela requerente.

    A previsão de cotas é tema latente no âmbito do Poder Judiciário, veja-se, por exemplo, o julgamento da citada ADPF 186, em que o relator da ação, ministro Ricardo Lewandowski, se valeu da opinião de diversos setores da sociedade para fundamentar o seu voto, por intermédio de audiências públicas ocorridas do dia 3 ao dia 5 de março de 2010.

    Ou seja, o próprio Supremo Tribunal Federal abriu a discussão sobre as cotas em universidades, dada a complexidade do tema, que exige muito mais do que uma decisão baseada tão somente em aspectos eminen-temente jurídicos mas requer a análise de condutas políticas e observância dos direitos fundamentais e dos direitos humanos.

    Outrossim, admitindo a complexidade do tema, no âmbito do cenário mundial, na Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, ocorrida em Durban, de 31 de agosto a 8 de setembro de 2001, ficou determinado que os Estados devem promover o acesso igual e efetivo a todos os membros da comunidade, especialmente aqueles que são vítimas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, nos processos decisórios da sociedade em todos os níveis e, em particular, em nível local; e devem incentivar o setor público a facilitar a participação desses grupos na efetiva vida econômica.

    Contudo, o relator originário, que inicialmente queria que a corregedora-geral instaurasse um procedimento em relação aos tribunais que já reservam vagas para negros em concursos públicos para provimento do cargo de juiz substituto para extinguir tais cotas, afirmou: N ão vejo possibilidades de o Conselho Nacional de Justiça fixar cotas para negros e índios no ingresso para a carreira da magistratura e para os cargos efetivos do Poder Judiciário. E não vejo essa possibilidade pelo prisma de ser justo ou injusto, legal ou ilegal, constitucional ou inconstitucional, mas pela senda, exclusivamente, da falta de competência deste Conselho, de acordo com os delineamentos traçados pela Emenda Constitucional nº 45/2004.

    Em relação à carreira de juiz e levando em consideração as competências constitucionais aplicáveis ao Conselho Nacional de Justiça, vê impeditivos para a atuação do Conselho na cotização do ingresso nas carreiras do Poder Judiciário.

    Assim, reputou inviável a fixação de cotas por parte deste Conselho, por absoluta falta de competência em fazer distinções onde a lei ou a Constituição não as façam. Segundo ele, cabe ao órgão administrativo a estrita observância do princípio da legalidade, que, como se sabe, tem sede constitucional no artigo 35, caput , da Carta Política de 1988.

    Como se não bastasse, as condições de ingresso nas carreiras da Magistratura são, segundo ele, de expressa reserva constitucional, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal por meio de legislação complementar.

    Diz que parece que o artigo 93, caput e inciso I, da Constituição Federal, e lídimo nesse sentido: Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: I ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em Direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, a ordem de classificação; (...) Nesse compasso, não obstante a falta de edição de nova lei complementar da magistratura, que poderá, inclusive, definir novas disposições sobre o ingresso, estão em vigor os artigos 78 e 79 da Lei Complementar 35, de 14 de março de 1979, conhecida como Lei Orgânica da Magistratura Nacional, que assim dispõem:

    Art. 78 O ingresso na Magistratura de carreira dar-se-á mediante nomeação, apos concurso público de provas e títulos, organizado e realizado com a participação do Conselho Secional da Ordem dos Advogados do Brasil § 1º A lei pode exigir dos candidatos, para a inscrição no concurso, título de habilitação em curso oficial de preparação para a Magistratura. § 2 Os candidatos serão submetidos a investigação relativa aos aspectos moral e social e a exame de sanidade física e mental conforme dispuser a lei. § 3 Serão indicados para nomeação pela ordem de classificação candidatos em número correspondente às vagas mais dois para cada vaga sempre que possível

    Art. 79 O juiz, no ato da posse, devera apresentar a declaração pública de seus bens, e prestara o compromisso de desempenhar com retidão as funções do cargo cumprindo a Constituição e as leis.

    Arrazoa que embora o Supremo Tribunal Federal não tenha se deparado com a questão aqui trazida, objeto deste processo, parece que a jurisprudência da Corte Constitucional não destoa do entendimento esposado acima, de que a competência para a fixação de requisitos para o ingresso na carreira de juiz e reservada a Lei Orgânica da Magistratura:

    AÇAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIMENTO INTERNO DO TJ/PE. RECONDUCAO DE MEMBROS DO CONSELHO DA MAGISTRATURA. INCONSTIT...

    Ver notícia na íntegra em Consultor Jurídico

    • Sobre o autorPublicação independente sobre direito e justiça
    • Publicações119348
    • Seguidores10986
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações82
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/cnj-definira-politica-publica-de-cotas-para-o-judiciario/100152006

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)