Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
26 de Abril de 2024
    Adicione tópicos

    Supremo Tribunal Federal versus supremo tabagismo federal

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 10 anos

    No Brasil pós-88, o Executivo tem desempenhado, frequentemente com o endosso do Legislativo, um papel relevante em favor do controle do tabagismo e, nesse particular, em defesa da saúde pública neste país. A esse propósito, vale relembrar a atitude corajosa de José Serra, seja como governador de São Paulo, seja enquanto ministro da Saúde, ao tomar as iniciativas para a legislação destinada, respectivamente, a impedir o fumo em locais públicos fechados e a publicidade de cigarros e similares em meios de comunicação de massa. Serra enfrentou forças poderosas da indústria do tabaco, então com influências marcantes nos órgãos governamentais e legislativos (e aqui, por parte deste escriba, não se trata de partidarização).

    É público e notório que, tendo em vista a aprovação de medidas de controle do tabagismo na esfera do Executivo e do Legislativo, os interesses econômicos vinculados ao tabagismo reorientaram sua estratégia de atuação para ter como foco primordial o Judiciário. Escritórios destacados e pareceres envolvendo valores milionários, inclusive de ministros aposentados do STF, como também de atual ministro quando ainda advogado, foram contratados pela indústria do tabaco. O lobby perante os juízes e tribunais, inclusive o STF, fortificou-se.

    Tudo isso, em princípio, constitui atividade legítima em uma sociedade que se equipara a um sistema de mercado, relembrando aqui a obra prima de Karl Polanyi, A Grande Transformação. Não se trata, nesta oportunidade, de defender um antitabagismo fundamentalista, que levaria à proibição do fumo, senão de controlar o tabagismo para impedir os seus efeitos nocivos à saúde pública e ao direito à vida (a propósito, seria salutar a legalização de grande parte das drogas hoje ilícitas, acompanhada dos devidos controles legais). Também não se trata, neste artigo, de negar que os textos normativos podem sofrer interpretações diversas, implicando, pois, normas diferentes conforme a perspectiva de observador em que se põe o intérprete. Essa pluralidade de compreensões de textos normativos é inevitável e mesmo salutar em uma sociedade complexa e plural. Não obstante, parece-me ser fundamental que haja certa coerência normativa ao decidir-se juridicamente. Essa exigência não é simplesmente uma questão de coerência lógica nos termos do princípio da não contradição, tão bem estudado pelo nosso brilhante Lourival Vilanova, que enfatizava ser o direito um sistema com contradições. Ela também tem um significado filosófico e sociológico na caracterização da racionalidade jurídica, sendo salientada por autores com posturas as mais diversas, com fundamentos, conteúdos e consequências os mais diferentes: prova de coerência como típica do discurso jurídico em Jürgen Habermas; integridade como característica do juiz ideal Hércules em Ronald Dworkin; consistência jurídica da decisão em Niklas Luhmann.

    O objetivo deste artigo é alertar para o perigo de que o Judiciário, inclusive o STF, torne-se refém e instrumento banalizado da ação estratégica da economia do tabaco, em detrimento da consistência jurídica e em descrédito do próprio Judiciário.

    O caso que me chamou a atenção foi a ADI 4.874, na qual se argui a inconstitucionalidade da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 14, de 15 de março de 2012, editada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária Anvisa. A Ação foi proposta pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), atuando no interesse de um setor de seus filiados, a indústria do tabaco. A RDC nº 14/2012-Anvisa, editada após audiência pública, estabelece os limites máximos de alcatrão, nicotina e monóxido de carbono na corrente primária da fumaça dos cigarros e a restrição do uso de aditivos em todos os produtos fumígenos derivados do tabaco comercializados no Brasil (artigo 1º). Essa resolução, então, determina os produtos que se incluem na categoria dos aditivos (artigo 3º, inciso I), para estabelecer aqueles cuja utilização em produtos fumígenos derivados do tabaco é proibida (artigo 6º) e permitir a utilização de outros (artigo 7º). Tema complexo é saber se procede tecnicamente a orientação da Anvisa em favor da saúde. Em tal discussão técnica, não tenho condições de entrar neste artigo.

    O fundamento jurídico da ADI 4.874, porém, parece-me passível de questionamentos críticos. Neste espaço, a dificuldade de argumentar é sobremaneira maior porque nos defrontamos com uma gama de advogados e juristas ilustres, algumas vezes com a cobertura formal e merecida do notável saber jurídico. A mencionada ADI conta com um parecer favorável assinado pelos destacados juristas José Paulo Sepúlveda Pertente (ministro aposentado do STF) e Luís Rob...

    Ver notícia na íntegra em Consultor Jurídico

    • Sobre o autorPublicação independente sobre direito e justiça
    • Publicações119348
    • Seguidores10991
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações20
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/supremo-tribunal-federal-versus-supremo-tabagismo-federal/116661672

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)