Mandado de segurança contra ato do Congresso e equilíbrio entre os poderes
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal fez do mandado de segurança contra alguns tipos de atos das mesas das duas casas do Congresso Nacional, e de suas comissões, um importante instrumento de proteção das prerrogativas parlamentares contra violações pela maioria[1]. Desde então, o uso desse instrumento por parlamentares individuais para esse fim tornou-se elemento essencial para a preservação das funções constitucionais do próprio Congresso Nacional[2].
No entanto, em função de mudanças naturais na composição da Suprema Corte, algumas decisões têm indicado uma possível revisão dessa tradição constitucional trintenária. A título de exemplo, citamos os acórdãos dos MS 31.816 e 32.033, ambos redigidos pelo ministro Teori Zavascki, nos quais o uso desse instrumento processual pelos parlamentares para a proteção de direito líquido e certo foi assimilado a uma espécie de controle judicial preventivo de constitucionalidade, o que não se permite no direito brasileiro.
O objetivo dessa coluna não é criticar essas sinalizações revisionistas, até porque o impacto desse posicionamento ainda não parece ter repercutido suficientemente nos meios jurídicos, senão propor uma interpretação do uso do mandado de segurança por parlamentares segundo a qual esse instrumento impediria ingerências indevidas do Poder Executivo sobre o Poder Legislativo e, logo, preservaria o equilíbrio entre os poderes da República[3].
1) O desvirtuamento do “Presidencialismo de Coalizão”: construção de bases parlamentares após as eleições e sem afinidades ideológicas
O sistema de governo no Brasil é conhecido, desde o clássico texto de Sérgio Abranches, como “presidencialismo de coalizão”[4]. Para manter sua dinâmica virtuosa, o modelo proposto por Abranches, dependeria de algumas condições, entre elas, a efetiva partilha do governo entre os partidos da coalizão. Com efeito, o governo de coalizão, composto por diversos partidos, deveria ser exercido tanto pelo partido que elegeu o chefe do Executivo, quanto por partidos com representação exclusivamente parlamentar. Isso implicaria em uma partilha do processo decisório efetivo, e não simplesmente a ocupação dos cargos na base do “do ut des”, onde o apoio parlamentar seria obtido após a eleição e mediante a distribuição de benefícios administrativos, ainda que legais, pelo Poder Executivo aos parlamentares[5].
Esse seria o “presidencialismo de coalizão” em sua forma virtuosa.
Ocorre que, frequentemente, nosso sistema de governo apresenta uma dinâmica distante da idealizada por Abranches. Nessa versão desvirtuada, o Poder Executivo utiliza-se de instrumentos de que dispõe legalmente para cooptar parlamentares que, não necessariamente, têm afinidades políticas com os programas do governo. Entre esses instrumentos estão: as nomeações para cargos no Executivo, a execução de emendas ao orçamento[6], nomeações para cargos em empresas estatais, e outros[7].
Essa cooptação pelo Executivo, com o consequente favorecimento a parlamentares que tenham aderido à base ou que pertençam a determinados partidos políticos, torna o apoio do Governo Federal um fator de desequilíbrio na eleição dos parlamentares. As recentes disputas dentro da base do atual governo, e entre a base e o Governo, ilustram o argumento, principalmente, as muitas dificuldades que o Executivo enfrentou com os deputados federais do PMDB, nos últimos meses. Essas dificuldades teriam sido motivadas pela constatação de que o partido do Governo (PT) estaria utilizando-se de instrumentos da administração pública para ganhar cadeiras parlamentares em prejuízo do seu parceiro de chapa na eleição presidencial[8].
Com o uso desses instrumentos pelo Poder Executivo, a sobrevivência parlamentar de diversos partidos e de seus congressistas passaria a depender, pelo menos em parte, da simpatia do Governo. Para o parlamentar e seu partido, a forma de conseguir essa simpat...
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