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16 de Abril de 2024
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    Cronologia revela falta de motivos para Justiça negar semiaberto a Dirceu

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 10 anos

    O sistema judiciário brasileiro é pródigo em exemplos de casos em que se verifica falta de rigor no manejo das regras. Mas também não faltam exemplos de exagero e crueldade — em geral, quando o promotor atende pelo nome de “clamor público” e o alvo das sanções ganha aparência de inimigo público, de forma a justificar o estado de exceção.

    Sob o comando do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, o sistema judicial arrastou por mais de seis meses a análise do pedido de trabalho externo do ex-ministro José Dirceu, preso em regime fechado desde o feriado de 15 de novembro de 2013. O respeito ao cumprimento da pena em regime semiaberto só ocorreu depois que o presidente do Supremo anunciou sua aposentadoria e renunciou à relatoria da Ação Penal 470.

    A cronologia do caso mostra como o ministro Joaquim Barbosa, a Vara de Execuções Penais e o Ministério Público do Distrito Federal se apoiaram numa série de boatos para protelar a regularização do semiaberto de Dirceu.

    Em 11 de abril de 2014, a própria Procuradoria-Geral da República defendeu o direito do ex-ministro ao semiaberto. Para o procurador-geral Rodrigo Janot, todos os requisitos formais — como a apresentação de proposta de trabalho à Justiça e os termos que explicam a atividade a ser desenvolvida — foram atendidos. O parecer ressaltou ainda que o sistema prisional de Brasília investigou e não encontrou qualquer prova sobre um suposto telefonema de Dirceu dentro da Papuda. Segundo Janot, na avaliação do Ministério Público Federal, não são necessárias “novas medidas” para apurar o caso.

    Quase um mês depois, em 9 de maio, o ministro Joaquim Barbosa negou o pedido, alegando que Dirceu ainda não cumpriu o mínimo de um sexto da pena para ter direito ao benefício. A decisão do então relator foi criticada pelo próprio procurador-geral, pela OAB, e por juristas e entidades ligadas ao sistema carcerário. A decisão de Barbosa poderia afetar a vida de quase 80 mil detentos que estão no semiaberto com direito ao trabalho. A defesa do ex-ministro entrou com agravo para que a decisão fosse levada ao Plenário do Supremo. Os advogados também apresentaram pedido de habeas corpus para garantia do direito assegurado pela Constituição.

    O agravo da defesa só foi a Plenário depois que Barbosa renunciou à relatoria. O ministro Luis Roberto Barroso foi sorteado como novo relator. No Pleno, o direito de Dirceu foi reconhecido por 9 votos a 1. O presidente Joaquim Barbosa, ciente da derrota que teria perante seus pares, se ausentou da votação.

    Preso por 7 meses e meio, Dirceu foi o único réu condenado ao semiaberto a ficar todo o período preso em regime fechado enquanto Barbosa esteve à frente de relatoria da AP 470. Não teve direito aos benefícios previstos em lei, o que denota a clara intenção política em mantê-lo detido em tempo integral. Para manter Dirceu preso, Barbosa também cassou o direito de outros réus condenados na AP 470 ao regime semiaberto.

    No julgamento dos Embargos Infringentes, em fevereiro, Joaquim Barbosa já havia admitido que elevou as penas na condenação por formação de quadrilha para assegurar que Dirceu e os demais petistas cumpririam pena em regime fechado. Derrotado pela maioria do Supremo, que absolveu os réus, Barbosa não desistiu de seu objetivo até o limite de sua precoce aposentadoria. Deixou a Presidência isolado dentro da corte e, no meio jurídico, criticado por todos aqueles que entendem que o julgamento e a execução penal da AP 470 foram “um ponto fora da curva” na história do Supremo e do próprio Estado Democrático de Direito.

    Confira a cronologia:

    18/12/2013 - O escritório de advocacia de José Gerardo Grossi formaliza a proposta de trabalho para José Dirceu. O cargo é para organização e manutenção da biblioteca jurídica, eventual pesquisa de jurisprudência e colaboração na parte administrativa, das 8h às 18h, com uma hora para almoço. O salário é de R$ 2,1 mil mensais.

    19/12/2013 - A defesa de Dirceu requer à Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal autorização para trabalho externo de Dirceu, com base no fato de que a pena de Dirceu se enquadra no regime semiaberto, e de que a lei garante o direito ao trabalho externo; Dirceu possui documentação pessoal em ordem; nenhum aspecto negativo de suas condições pessoais foi vislumbrado pelo STF durante o julgamento ao qual foi submetido; há uma proposta formal de trabalho.

    17/1/2014 - A Folha de S.Paulo noticia que o secretário do governo da Bahia, James Correia, teria conversado com Dirceu pelo celular no dia 6 de janeiro. A história já havia sido publicada no dia 7 de janeiro pelo jornal Correio, da Bahia. A Folha apenas a reproduziu.

    17/1/2014 - Em nota oficial, o secretário James Correia nega que tenha conversado por telefone com Dirceu. Ele já havia contestado a informação dez dias antes, quando o Correio a publicou. A defesa de Dirceu também nega, em nota oficial, que tenha havido a alegada conversa.

    17/1/2014 - A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal abre investigação para apurar o caso.

    22/1/2014 - A investigação da Secretaria de Segurança Pública do DF conclui que o suposto telefonema nunca ocorreu. O Centro de Internamento e Reeducação (CIR), onde Dirceu está preso, afirma que a notícia é inverídica.

    24/1/2014 - Mesmo com a investigação negando a ocorrência do telefonema, a Vara de Execuções Penais do DF suspende por 30 dias a análise do pedido de trabalho externo de Dirceu. Alega que a investigação não ouviu o ex-ministro.

    27/1/2014 - A defesa de Dirceu recorre ao STF contra a suspensão da análise do trabalho externo. A defesa diz que:

    - A suspensão se baseou em nota de jornal;
    - Uma investigação já mostrou que a conversa nunca existiu;
    - Ignorar a conclusão da investigação e tomar uma nota de jornal como motivo é um atentado aos direitos fundamentais;
    - A Vara de Execuções Penais agiu de forma ilegal ao determinar diligências em um procedimento disciplinar, já que a Lei de Execucoes Penais não lhe dá essa competência;
    - Por sua idade, Dirceu tem o direito, garantido por lei, de ter o pedido analisado com prioridade.

    29/1/2014 - O presidente em exercício do STF, Ricardo Lewandowski, determina a retomada da análise sobre o trabalho externo de Dirceu. Ele diz:

    - Quando a VEP mandou suspender a análise, a investigação já havia mostrado a inexistência da conversa;
    - A VEP recebeu o ofício expedido pela Direção do Centro de Internamento e Reabilitação afirmando que nada foi identificado que sustentasse o suposto contato telefônico;
    - A VEP também recebeu despacho da Coordenadoria-Geral da Gerência de Sindicâncias da Subsecretaria do Sistema Penitenciário com a mesma conclusão.

    3/2/2014 - O relator de uma segunda investigação aberta no Centro de Internamento e Reeducação (CIR) pública despacho concluindo que nada atesta a existência da conversa. O documento acrescenta que Dirceu foi ouvido e os procedimentos legais foram seguidos e observados. Por fim, o relator é taxativo: “Sendo assim, sugere-se o arquivamento do inquérito disciplinar”.

    3/2/2014 - O Conselho Disciplinar do Centro de Internamento e Reeducação aprova, por unanimidade, o parecer do relator.

    3/2/2014 - Diante da votação unânime, a direção do CIR determina o encerramento do caso.

    4/2/2014 - A defesa de Dirceu encaminha a Joaquim Barbosa todas essas últimas decisões do Centro de Internamento e Reeducação.

    5/2/2014 - A procuradora Marcia Milhomens Sirotheau Corrêa, do Ministério Público Federal, emite parecer favorável ao trabalho externo de Dirceu.

    11/2/2014 - Apesar da manifestação do MPF emitida seis dias antes, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, reverte a determinação de Lewandowski sobre a análise imediata do pedido de trabalho externo, de forma monocrática. Para justificar a decisão, Barbosa alega que Lewandowski deveria ter ouvido o Ministério Público (que já havia dado parecer favorável ao pedido de trabalho) e a Vara de Execuções Penais. Barbosa pede que a Procuradoria-Geral da República se manifeste sobre o pedido de emprego externo e, se for o caso, peça diligências sobre o caso.

    12/2/2014 - A Procuradoria toma ciência da decisão de Barbosa e não faz nenhum pedido em relação a diligências ou outras medidas.

    12/2/2014 - A defesa de Dirceu entra com recurso no STF contra a decisão de Barbosa, pedindo que o caso seja levado a Plenário em caráter de urgência. A defesa diz que:

    - A conversa telefônica nunca existiu, como já havia atestado a investigação;
    - A suspensão da análise ocorreu mesmo após a conclusão da investigação;
    - O Ministério Público tomou ciência da decisão de Lewandowski sobre a retomada da análise e não registrou qualquer recurso;
    - Por ser idoso, Dirceu tem o direito, garantido por lei, de ter o pedido analisado com prioridade.

    Barbosa faz silêncio sobre o pedido. Como presidente, cabe a ele determinar o que entra ou não na pauta da corte.

    13/2/2014 - A defesa de Dirceu encaminha petição a Joaquim Barbosa ressaltando que:

    - A VEP suspendeu a análise do pedido de trabalho externo somente até a conclusão da investigação. Com a conclusão atestando a inexistência de falta disciplinar, não há mais motivo para a suspensão;
    - O MPF já se manifestou favoravelmente ao trabalho externo.

    24/2/2014 - O juiz Bruno Ribeiro, da Vara de Execuções Penais do DF, adia o depoimento de Dirceu no processo de sindicância que apura o suposto uso do celular. Não foi dada nenhuma justificativa para o adiamento.

    25/2/2014 - O Ministério Público envia ofício à Vara de Execuções Penais pedindo rigor na investigação de supostas "regalias" aos petistas. O documento recomenda que, caso sejam constatados os privilégios, que eles sejam transferidos para presídios federais.

    Os promotores se baseiam em uma onda de boatos publicados dias antes pelo jornal O Globo que apontam supostas regalias a Dirceu, detido no Centro de Internamento e Reeducação (CIR), e a Delúbio Soares, preso no Centro de Progressão Penitenciária (CPP). O jornal noticiou que parlamentares visitaram Dirceu em horário não permitido e que um vice-diretor do CPP foi demitido por ter obrigado Delúbio a tirar a barba e proibir que um carro da CUT entrasse na penitenciária. Na série de boatos, também acusam Delúbio de ter comido uma feijoada no presídio no fim de semana anterior.

    26/2/2014 - O Ministério Público do DF encaminha à Vara de Execuções Penais pedido, sem fundamentação legal, para quebrar o sigilo telefônico de todos os números que tenham feito ou recebido ligações, de 1º a 16 de janeiro, entre a região da Papuda e a Bahia. Além de sem fundamento, o pedido é “equivocadamente” encaminhado à Vara de Execuções Penais, já que não caberia à VEP a abertura de investigação criminal. O juiz Bruno Ribeiro engaveta o pedido por mais de um mês.

    27/2/2014 - A partir das reportagens sobre as supostas regalias, o juiz Bruno Ribeiro suspende o benefício de trabalho externo de Delúbio Soares, mandando-o de volta para o regime fechado, e cobra explicações do governador do DF, Agnelo Queiroz.

    11/3/2014 - Dirceu é ouvido, por videoconferência, pelo juiz Bruno Ribeiro, na presença de seus advogados e também do Ministério Público do DF, e nega qualquer regalia ou uso de celular.

    15/3/2014 - Na mesma semana, a revista Veja viola a privacidade de Dirceu e pública foto do ex-ministro no interior da Papuda. A reportagem de capa denuncia, sem qualquer prova e em um exemplo de antijornalismo, que Dirceu teria uma rotina de regalias no presídio. O objetivo explícito é reforçar a onda de boatos e indispor os petistas com os demais detentos na Papuda.

    16/3/2014 - A Secretaria de Segurança Pública do DF promete abrir sindicância para apurar as condições em que o ex-ministro José Dirceu foi fotografado.

    25/3/2014 - O governador do DF, Agnelo Queiroz, pede que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal analise a conduta do juiz Bruno Ribeiro por não ter apresentado qualquer indício sobre as supostas regalias aos petistas. Agnelo também argumenta que o juiz não teria "jurisdição" para questionar o governador.

    25/3/2014 - A Corregedoria do Tribunal de Justiça do Distrito Federal abre sindicância para avaliar se o juiz Bruno Ribeiro cometeu falta disciplinar ao inquirir diretamente Agnelo. O magistrado tem cinco dias para se defender.

    25/3/2014 - Após a abertura da investigação pelo TJ, o juiz Bruno Ribeiro anuncia seu afastamento do caso, alegando “motivo de foro íntimo”.

    27/3/2014 - O TJ-DF determina a transferência do juiz Bruno Ribeiro da Vara de Execuções Pena...







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