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16 de Abril de 2024

Perigo da criminalização judicial e quebra do Estado Democrático de Direito

Publicado por Consultor Jurídico
há 10 anos

O alerta de Alessandro Baratta: afinal, o que queremos?

No final dos anos 1990, o grande criminólogo Alessandro Baratta esteve em Porto Alegre participando de um simpósio sobre criminologia e feminismo. Em pauta a violência contra as mulheres e minorias. As mulheres presentes, a expressiva maioria professando um pensamento progressista, tinham um objetivo: criminalizar duramente os delitos desse jaez. Baratta, homem de militância progressista, no início de sua conferência, fez a seguinte reflexão: neste congresso demonstramos um alto grau de esquizofrenia. Em sentido amplo, todos queremos um direito penal mínimo e o máximo de liberdade; todavia, quando atingidos pela situação, ou seja, em sentido estrito (referindo-se às mulheres e minorias), queremos o mais alto de punição. Assim, ao mesmo tempo manifestamos a nossa descrença no direito penal e entoamos uma ode em seu louvor, pugnando pelo máximo de punição. Afinal, perguntou: “o que queremos”?[1]

Perigo da criminalizao judicial e quebra do Estado Democrtico de Direito

Passados tantos anos, durante os quais estamos buscando aperfeiçoar as garantias constitucionais, eis que nos deparamos com um Mandado de Injunção (4.733-STF) — instrumento criado para garantir as liberdades fundamentais e em geral os direitos civis, políticos e sociais — pretendendo (consoante trecho extraído dos autos do processo)

“obter a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente (mas não exclusivamente) das ofensas (individuais e coletivas), dos homicídios, das agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de gênero, real ou suposta, da vítima, por ser isto (a criminalização específica) um pressuposto inerente à cidadania da população LGBT na atualidade”.

O Mandado de Injunção, no seu polo ativo, é assinado pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT); o réu: o Congresso Nacional que estaria em mora por não criminalizar os atos acima referidos. O Procurador-Geral da República, na linha dos pronunciamentos dos presidentes da Câmara e do Senado, exarou parecer pelo não conhecimento do mandamus injuntivo. Já o Supremo Tribunal Federal, em decisão monocrática do ministro Ricardo Lewandowski, fulminou o pedido, aduzindo, entre outras questões, que a criminalização de condutas depende de lei, invocando precedentes da corte.

A questão, portanto, parecia encerrada, desembocando na resposta juridicamente apropriada. No entanto, a ABGLT impetrante ingressou com agravo regimental. Até então, nada de anormal. O que surpreendeu, deveras, foi o parecer da Procuradoria-Geral da República (ler aqui) que, contrariando o parecer anterior e a jurisprudência da Suprema Corte, exarou entendimento favorável:

“O Mandado de Injunção, na linha da evolução jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, presta-se a estabelecer profícuo e permanente diálogo institucional nos casos de omissão normativa. Extrai-se do texto constitucional dever de proteção penal adequada aos direitos fundamentais (Constituição da República, art. , XLI e XLII). Em que pese à existência de projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional, sua tramitação por mais de uma década sem deliberação frustra a força normativa da Constituição. A ausência de tutela judicial concernente à criminalização da homofobia e da transfobia mantém o estado atual de proteção insuficiente ao bem jurídico tutelado e de desrespeito ao sistema constitucional. Parecer pelo conhecimento e provimento do agravo regimental. PGR Mandado de Injunção 4.733/DF (agravo regimental). Parecer 4.414/2014-AsJConst/SAJ/PGR).

Ou seja, para a Procuradoria-Geral da República, é possível, via Mandado de Injunção, criminalizar a homofobia e a transfobia, posição que, permissa vênia, vai na contramão da história constitucional, porque admite, a partir da tese da proibição de proteção insuficiente, que o Poder Judiciário pode estabelecer criminalizações. Segundo o parecer, existe uma clara falta de norma regulamentadora que

“inviabiliza o exercício da liberdade constitucional de orientação sexual e de identidade de gênero, bem como da liberdade de expressão, sem as quais fica indelevelmente comprometido o livre desenvolvimento da personalidade, em atentado insuportável à dignidade da pessoa humana (...).

As indagações que cabem são: Qual seria a relação de uma criminalização com o livre desenvolvimento da personalidade? Qual é o papel do direito penal em um Estado Democrático? Cuida-se, aliás, de questionamentos que não dizem respeito apenas ao caso da criminalização da homofobia, mas que tocam a problemática mais ampla do uso (ou abuso?!) d...

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