Municípios erram ao tentar tributar ISS sobre operação de cartão
Conforme tivemos a oportunidade de estudar[1], a forma mais usual de fomento à guerra fiscal em ISS é a subversão pelos intérpretes da realidade fática, com nítida manipulação de conceitos jurídicos, como é o caso do conceito de “estabelecimento”.
Assim, o único antídoto à famigerada guerra fiscal em ISS é o repúdio irrestrito a toda e qualquer interpretação que não se enquadre no invólucro positivado em vigor, de índole constitucional.
1. O conceito de estabelecimento no sistema jurídico
Em questão de ISS, o conceito de “estabelecimento prestador” é dos mais controvertidos, muitas vezes confundido com “estabelecimento do prestador”.
A expressão “estabelecimento prestador” está contida nos artigos 3º e 4º da Lei Complementar 116/03, devendo a interpretação desse instituto, como dito acima, pressupor seu exame em cotejo com o ordenamento jurídico globalmente considerado.
E nessa hora é imprescindível nos fiarmos no estudo empreendido pelo destacado ministro do Superior Tribunal de Justiça, Herman Benjamin, no seu voto-vista no REsp 1.060.210, no qual esclarece que o conceito de estabelecimento tem dupla classificação: a) a universalidade de bens utilizados pelo empresário ou pela sociedade empresária, sinônimo de fundo de comércio, conforme o artigo 1.142 do Código Civil; e b) local determinado geograficamente onde a empresa se apresenta ao mercado, produzindo, vendendo, prestando serviços, acepção adotada nos artigos 11, parágrado 3º, da Lei Complementar 87/1996; 969 do Código Civil; 49 do Código de Defesa do Consumidor; 3º da Lei de Falências; 2º, parágrafo 1º, da Lei Antitruste, entre outros.
Dessa forma, não é possível se confundir “sede” ou “domicílio” da empresa com “estabelecimento”. E continua o ministro Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin:
“Por tudo isso, conclui-se tranquilamente que sede não se confunde com estabelecimento; (...) Veremos, a seguir, que a legislação nacional do ISS sempre se referiu ao estabelecimento, jamais à sede da contribuinte.”
Realmente difícil saber exatamente onde determinados serviços são efetivamente prestados. Daí a importância de se respeitar os artigos 114 e 116, inciso I, do Código Tributário Nacional, detalhando claramente o que é necessário e suficiente à consumação do tipo tributário.
2. A complexidade do sistema de cartões magnéticos para efeitos tributários
A maioria dos municípios brasileiros tenta, incorretamente, tributar o ISS sobre a operação de cartão de crédito e débito, imputando à instituição financeira ou à credenciadora a exação na sua integralidade, como se tudo fosse reduzido à “administração de cartões de crédito, débito e congêneres”, como previsto no item 15.01 da Lista de Serviços da Lei Complementar 116/03. Contudo, erram os municípios que assim procedem, pois cobram mais do que podem e sobre uma “ficção” que eles não têm legitimidade para tributar.
Os cartões magnéticos e demais operações eletrônicas (DOCs, TEDs e transferências) já substituíram de forma irreversível a grande circulação de dinheiro. Na atualidade, o dinheiro é de plástico. Em relação aos cartões magnéticos, estão agora a eles sendo conjugados microdispositivos (chip) com capacidade e segurança no armazenamento de dados, sendo certo que a captura pode ser com ou sem contato. Em rasa definição, cartão magnético é objeto plástico, retangular e que contém uma tarja magnética ou chip com dados digitais.[2] Essa tarja magnética e chip armazenam dados com linguagem binária (combinação de uns e zeros). No momento em que o cartão é passado ou inserido em um computador/máquina de leitura, esses dados são capturados, compilados e transmitidos para os interessados no seu processamento/análise.
Apesar de ainda haver poucas vozes renitentes contrárias, o ISS é devido no “estabelecimento prestador” considerado como local onde consumadas as situações necessárias e suficientes à ocorrência desse serviço/fato imponível, ou seja, o local da prestação do serviço, tendo no átimo do prestar (realização do verbo previsto no tipo tributário) configurado unidade econômica ou profissional, pouco importando o nome dessa unidade (posto de atendimento, representante, contato ou qualquer outro), ressalvadas as exceções legais previstas nos incisos do artigo 3º da Lei Complementar 116/03, exceções essas que não abarcam a hipótese de tributação sobre os serviços consumados nas transações com cartões de crédito e débito.
A despeito disso, é antiga e sem previsão de término a guerra fiscal entre municípios com relação à competência territorial para imporem suas exações. E, a nosso sentir, o problema é único: definir no que consiste e onde ocorrem determinadas prestações de serviços, como é o caso das transações por meio de cartões de crédito e débito.
Trata-se de operação absolutamente complexa, representada por uma cadeia de relações jurídicas, mas que, apesar de sinérgicas, formam núcleos de distintos procedimentos que, por conseguinte, subsumem-se a tipos tributários diversos. Ou seja, entre determinado usuário utilizar o seu cartão magnético e o estabelecimento comercial receber o produto daquela venda, há inúmeras fases, carecedoras tanto de correta individuação qua...
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