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27 de Abril de 2024

PEC sobre demarcação de terras indígenas é inconstitucional

Publicado por Consultor Jurídico
há 9 anos

Está em discussão no Congresso Nacional Proposta de Emenda à Constituição Federal que altera os artigos 61 e 231, da Constituição Federal, e artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a fim de modificar o procedimento de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.

À proposta inicial (PEC 215/2000), foram apensadas diversas outras que tratam do tema[1],tendo o relator, Deputado Osmar Serraglio, apresentado Substitutivo à Proposta de Emenda à Constituição 215-A/2000.

Dentre as diversas alterações apresentadas nesse substitutivo, destaco os dispositivos que submeteriam o procedimento de demarcação de terras indígenas à aprovação de projeto de lei:

“Art. O § 1º, do art. 61 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do seguinte inciso III :

Art. 61 .................................................

§ 1º São iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

..................................................................

III - delimitem terras indígenas.”(NR)

Art. O art. 231 da Constituição Federal passa a vigorar com as seguintes alterações:

‘Art. 231....................................................

§ 9º A delimitação definitiva das terras indígenas far-se-á por lei, competindo ao Poder Executivo propor em projeto de lei de sua iniciativa privativa os limites e confrontações da área indígena, ou, havendo conflito fundiário, a permuta de áreas, assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo relativo às encravadas em seus territórios.”

Todavia, nesse ponto, manifestamente inconstitucional a proposta. Senão, vejamos.

O artigo 60, parágrafo 4º, da Constituição Federal consubstancia limitações ao poder constituinte derivado reformador, ao estabelecer parâmetros mínimos de garantia da unidade do texto constitucional, por meio das denominadas “cláusulas pétreas”:

“§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais”

Em outras palavras, a revisão constitucional não pode atingir o núcleo essencial da proposta do poder constituinte originário, como leciona Canotilho:

“A constituição garante a sua estabilidade e conservação contra alterações subversivas do seu núcleo essencial através de cláusulas de irreversibilidade e de um processo “agravado” de leis de revisão. Não se trata de defender, através destes mecanismos, o sentido e características fundamentais da constituição contra adaptações e mudanças necessárias, mas contra a aniquilação, ruptura e eliminação do próprio ordenamento constitucional, substancialmente caracterizado.”[2]

De outro lado, diferentemente das regras, os princípios são considerados “mandados de otimização”, que têm caráter “normogenético”, na medida em que se prestam a criar e orientar a aplicação da regra. Dessa forma, o poder de reforma do constituinte derivado também está sujeito à adequação aos princípios constitucionais norteadores originais.

Nessa linha, os direitos territoriais dos povos indígenas devem ser interpretados, em primeiro lugar, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que constituem em última análise garantia à existência das comunidades indígenas nos limites previstos constitucionalmente, isto é, as terras utilizadas “para suas atividades produtivas”, mais “as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar” bem como aquelas “necessárias à reprodução física e cultural” (artigo 231 da Constituição Federal).

O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana foi estabelecido como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (artigo da CF/88), sendo considerado um princípio maior, norteador na ponderação de valores constitucionais, situando-se na doutrina como uma exceção à igualdade hierárquica dos princípios.

Tal proteção advém também de compromissos assumidos em diversos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos aos quais aderiu o Brasil, notadamente a Convenção OIT 169 e o Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos/1969).

Importante ressaltar, nesse ponto, que o parágrafo 2º do artigo da Constituição dispõe expressamente que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Além disso, em que pese o direito originário às terras indígenas não tenha um caráter universalista, a doutrina reconhece que direitos atribuíveis a coletividades determinadas também podem constituir direitos fundamentais, em razão das singularidades dos sujeitos que compõem as sociedades multiculturais.[3]

Aliás, no julgamento da PET 3.388 (TI Raposa Serra do Sol), o Supremo Tribunal Federal identificou o caráter de direito fundamental que reveste a demarcação das terras indígenas, tendo em vista ser a “concretização constituciona...


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