Erros apontados no projeto do Código Penal são na verdade escolhas diferentes
Artigo crítico ao Projeto de Reforma do Código Penal foi publicado em 28 de janeiro de 2014, nesta ConJur, pelos juristas Alaor Leite e Gustavo Quandt[1]. A despeito de suas qualidades, o estudo oferece algumas inconsistências. Por exemplo:
— apontam que a pena do crime do artigo 195 — Favorecimento da prostituição ou da exploração sexual de vulnerável, 4 a 10 anos de prisão — é apenas a metade da pena do próprio abuso sexual deste mesmo doente mental — artigo 192 — Estupro de vulnerável , pena de 8 a 12 anos de prisão. Deixando de lado a matemática estranha (pois “metade” de 8 a 12 seriam 4 a 6 e não 4 a 10...), não se aperceberam eles que o tipo do artigo 195 não exclui a sanção para o estupro do vulnerável!
— eles dizem que “o favorecimento pessoal no terrorismo (artigo 246) sofre uma antecipação da punibilidade (“dar guarida a pessoa […] que esteja por praticar o terrorismo”) que não se previu nem para o próprio terrorismo (artigo 245)”. Bem, fica anotado esse pedido de “bis in eadem”. Se, porém, o que pretenderam dizer é relativo a atos preparatórios tipicamente descritos, eles estão também no artigo 245.
— quando criticam que as penas da omissão de socorro, artigo 137, são as mesmas do crime de abandono de incapaz, artigo 136, esqueceram-se de ler o resto do artigo 137, que traz figuras qualificadas e com aumento de pena que desigualam as sanções previstas.
— como exemplo do “nivelamento de condutas fundamentalmente diversas”, exemplificam com a pena mínima da calúnia, artigo 141, e da difamação, artigo 142, que é a mesma, “embora na primeira o fato imputado, mais do que desonroso, seja criminoso”. Ora, há imputações falsas de fatos não-criminosos que podem ser tão ou mais ofensivas à honra objetiva do que a imputação de fatos criminosos. Imputar a alguém a prática de certas práticas sexuais com terceira pessoa — o que não é crime — pode ser mais ofensivo do que dizer que ele praticou um dano, artigo 163, por exemplo. É uma obviedade que deveria prescindir de explicações.
— criticam que a pena mínima do crime de lesões corporais seguidas de morte é idêntica à das lesões graves de 3º grau. Só que a conduta das lesões graves é dolosa e a da lesão seguida de morte, preterdolosa. Além disso, as penas máximas não são idênticas: 8 anos num caso, 12, no outro.
— dizem que o projeto traz uma definição ruim de tentativa, no artigo 21. Devem tê-la achado ruim por esta razão, pois, no Projeto, a definição está no artigo 19[2] e repete a redação do atual artigo 14, II, do Código Penal.
Os autores não atinaram para um aspecto importante da proporcionalidade das penas. O acervo de penas mínimas é restrito, muito menor do que o rol de crimes. Deste modo, elas podem coincidir e muitas vezes o fazem. Não há como prever centenas de penas mínimas diversas. Ao longo do projeto, estas penas comumente são de um ou de dois anos. Se procurarem — não só no projeto, mas no Código Penal vigente — verão dezenas de condutas diversas com a mesma pena mínima. Isto não significa, necessariamente, desproporcionalidade. A diferenciação da resposta penal pode vir com agravantes, causas de aumento, figuras qualificadas e variações na descrição típica, regras sobre concurso de crimes, etc. Claro que há distorções que podem e devem ser corrigidas. Se adotada aquela lógica, a pena mínima do homicídio deveria ser dezenas de vezes maior do que a do furto, por exemplo. Se a primeira é de seis meses, a do homicídio deveria ser de 30 anos, porque matar alguém é ao menos 60 vezes mais grave do que subtrair coisa alheia móvel. Eu dir...
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