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18 de Abril de 2024
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    "Supremo deveria fazer análise realista do que pode de fato julgar"

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 9 anos

    O constitucionalista Eduardo Bastos Furtado de Mendonça passou um ano por dentro das engrenagens do Supremo Tribunal Federal, como assessor do ministro Luís Roberto Barroso. E afirma que ao menos metade de todo os recursos humanos do tribunal atuam no funcionamento de uma espécie de corte paralela, desconhecida da maioria dos brasileiros, focada na extensa quantidade de processos e na análise de questões repetidas.

    “É humanamente impossível [para cada ministro] imprimir uma marca pessoal em tudo, já que existe um Supremo que engana a si mesmo e aceita um volume irreal de processos porque tem que prestar jurisdição”, afirma.

    Para ele, o STF deveria ser mais rigoroso na análise de temas com repercussão geral e adotar um filtro mais realista daquilo que pode fazer. Grosso modo, deveria deixar de tentar abraçar tudo.

    “Não adianta dizer que um caso é importante, mas só será julgado daqui a 10 anos”, avalia, afirmando que às vezes é mais importante ter um assunto julgado do que bem julgado. Mendonça concorda, por exemplo, com medidas que têm restringido o julgamento de pedidos de Habeas Corpus na corte.

    Ele deixou o cargo de assessor em 2014 — brinca que cumpriu um ano de pena com bom comportamento, apressando-se em dizer que “a piada é boa, mas não é justa”, fazendo elogios à experiência.

    Atualmente se dedica ao escritório Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça & Associados, que busca caminhar trilhos próprios desde a saída do ministro Barroso, e leciona no Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) a disciplina Direito Constitucional — área que começou a se especializar ainda nos tempos de graduação, como monitor na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Na UniCEUB coordena o Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais, idealizado pelo ministro Carlos Ayres Britto.

    Assim como a Constituição “trata de tudo”, uma conversa com o advogado abrange vários temas, que passam pelo Direito Penal, pelo papel do Judiciário e por discussões políticas, como o financiamento privado de campanhas eleitorais e o que ele considera um “escândalo” que acabou passando despercebido: a aprovação da Emenda Constitucional 86, do chamado “orçamento impositivo”, que obriga o governo federal a repassar dinheiro público para parlamentares gastarem como quiserem.

    Advogado em alguns casos do Google no Brasil, ele ainda fala sobre a liberdade de expressão e comenta a aplicação do direito do esquecimento, que tem sido mais conhecido desde que a gigante da internet foi obrigada a retirar de buscas nomes de cidadãos europeus.

    Mendonça é autor do livro A Constitucionalização das Finanças Públicas no Brasil – Devido Processo Orçamentário e Democracia (Editora Renovar, 2010), mestre e doutor em Direito Público pela Uerj, com uma temporada de pesquisa na Humboldt Universität zu Berlin, na Alemanha.

    Leia a entrevista:

    ConJur – O senhor atuou entre 2013 e 2014 como assessor de ministro. Algo o surpreendeu quando descobriu como funcionava por dentro o Supremo Tribunal Federal?
    Eduardo Mendonça –
    É surpreendente a percepção de que existem dois Supremos: a corte constitucional, das causas importantes, e outra que busca manter sob controle um volume enorme de processos, com uma atividade quase industrializada. O Supremo que costumamos imaginar é a parte mais importante do trabalho, mas, em termos percentuais, é a menor parte. Se um ministro produz dez mil decisões no ano, é evidente que apenas a minoria recebeu atenção pessoal diferenciada. É humanamente impossível imprimir uma marca pessoal em tudo, já que existe um Supremo que engana a si mesmo e aceita um volume irreal de processos porque tem que prestar jurisdição.

    ConJur – Como funciona esse julgamento sem a participação direta do ministro?
    Eduardo Mendonça –
    Primeiro é preciso explicar que a maior parcela das ações no Supremo chega pela via recursal: Recurso Extraordinário, Agravo em Recurso Extraordinário... Dentro desse universo, a maioria não pode ser conhecida por razões formais — devido à jurisprudência defensiva que o próprio tribunal criou ao longo do tempo — ou repete o que já foi analisado. Isso gera um volume de decisões monocráticas de mérito que dão ou negam provimento, pois repetem decisões anteriores. O ministro então controla basicamente se a equipe enquadrou corretamente o caso específico na jurisprudência. O próprio andamento dos recursos ajuda a perceber isso. Se há uma quantidade enorme de Agravos Regimentais, certamente vai acender uma luz amarela de que possivelmente algo tem sido mal aplicado. Mesmo que bem feita, essa parte mecânica não deveria estar no STF. Não é saudável que o tribunal precise gastar uma quantidade enorme dos seus recursos humanos para isso. Se você olhar em cada gabinete, existem cerca de 40 pessoas atuando. Pelo menos 20 estão focadas em fazer a máquina girar em torno de repetições.

    ConJur – Existem saídas para esse cenário?
    Eduardo Mendonça –
    O exame de repercussão geral deveria ser realmente rigoroso, baseado na identificação de questões constitucionais importantes. Essa discussão já vem sendo feita no Supremo. Se você observar, a lógica da repercussão geral já era impedir que isso continuasse acontecendo, porque o tribunal decidiria uma questão paradigma que se aplicaria em massa. Só que, frequentemente, é reconhecida a repercussão geral em questões constitucionais nem sempre importantes, porque a Constituição de 1988 tratou de tudo.

    ConJur – Nos Estados Unidos seria fácil fazer esse filtro, já que a Constituição americana trata de temas mais limitados...
    Eduardo Mendonça –
    Muito mais fácil. Só que o Supremo adotou inicialmente um filtro muito brando. Nos primeiros anos, quase tudo teve repercussão geral reconhecida. Hoje em dia a quantidade caiu muito, mas ficou um acervo grande porque o Supremo inicialmente não exerceu esse poder de agenda. O ministro Barroso tem falado bastante sobre isso. A repercussão geral deve ser considerada à luz do que é viável julgar. Não adianta considerar um caso importante, mas só julgá-lo daqui a 10 anos.

    ConJur – É como se fosse minha própria agenda: eu gostaria de fazer várias coisas, mas só tenho condições de resolver algumas?
    Eduardo Mendonça –
    É escolher o que é importante dentro de uma análise realista do que é possível fazer. Não adianta dizer que uma questão é muito importante e deixá-la esperando por julgamento, com causas semelhantes sem jurisdição, recursos que não transitam nunca. Colocar uma questão hoje no final da fila da repercussão geral é dizer que ela é importante para ser julgada daqui a sete a...

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