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24 de Abril de 2024

Amor não é obrigatório, mas abandono afetivo de criança gera dano moral

Publicado por Consultor Jurídico
há 8 anos

Amor no obrigatrio mas abandono afetivo de criana gera dano moral

Cuidar da prole é uma obrigação constitucional e, para alguns julgados, o abandono afetivo de um dos genitores implicaria numa ilicitude civil. A jurisprudência vem entendendo ser devida a indenização por danos morais por tratar-se de ato ilícito (abandono afetivo) capaz de gerar prejuízo moral ou material e toda ilicitude que cause danos (material ou moral) deve ser indenizado.

Parte da doutrina, talvez a minoritária, entende incabível a pretensão de prejuízos por abandono afetivo pela impossibilidade de considerar ilícito o desafeto por alguém, ainda que este alguém seja o próprio filho. Como dizia a máxima: Ninguém pode ser punido pelo desamor!

Em outras palavras, sustenta parte da doutrina não ser razoável que por lei ou contrato se comine, sob pena de ilícito civil, amar alguém. O amor, próprio do ser humano, é gratuito e incondicional, não pode ser comprado ou alugado, menos ainda imposto.

Mas não é a falta de amor que gera dano, não é o desamor, por si só, o ato ilícito praticado capaz de gerar o dano moral, mas sim a negativa em desferir amparo, assistência moral e psíquica, é desatender as necessidades em prejuízo da formação de uma criança, é, em muitos casos, desfazer os vínculos de afetividade já estabelecidos, é, por derradeiro, o descumprimento dos deveres decorrentes do poder familiar.

A ordem constitucional define o cuidado como valor jurídico pertinente ao dever de criar, educar e acompanhar, assegurando a dignidade da pessoa humana e a proteção dos interesses da criança e adolescente. Este dever de cuidado, decorrente do poder familiar, quando ignorado desdobra-se em ato ilícito.

Não é qualquer comportamento omissivo ou ativo capaz de caracterizar o ato ilícito passível de indenização. Deve estar presente a negativa injustificada dos deveres do poder familiar, haverá de ocorrer o distanciamento na convivência familiar; a omissão ou ação deve comprometer seriamente o desenvolvimento e formação psíquica, afetiva e moral; deve-lhe causar dor, submetê-lo ao vexame, causar-lhe sofrimento, humilhação, angústia.

Como efeito, pelo viés prático, revela-se extremamente dificultoso a valoração dos fatos possíveis de serem alegados e provas passíveis serem produzidas num processo que se pretenda indenização por abandono afetivo.

Outrossim, considerando que o pano de fundo para a fundamentação deste tipo de ação seja o descumprimento do art. 227, da Constituição Federal (como decidido no REsp 1.159.242/SP), o Autor da ação ou vítima do abandono deve ser, necessariamente, uma criança, adolescente ou jovem e jamais um adulto. Ou seja, um adulto jamais terá pertinência ou legitimidade para propor uma ação desta natureza, salvo se alegar fato ocorrido enquanto ainda adolescente, ressalvados os prazos prescricionais.

Ainda, a obrigação que sustenta a tese é da família e não do pai ou da mãe biológicos isoladamente. Família no contexto sócio-afetivo da palavra, incluindo pais adotivos ou padrastos e madrastas, ou avós e tios, ou aqueles que mantém o convívio com a criança.

Vale ainda comentar que os mesmos fatos que constroem a causa de pedir de eventual ação indenizatória por abandono afetivo, são os mesmos fatos que implicam na perda do poder familiar, nos termos do art. 1.638, II, do Código Civil e art. 24 do Estatuto da Criança e Adolescente, a qual, se decretada, não absolve o réu da ação indenizatória.

Conclui-se que há, indiscutivelmente, necessidade de uma tutela por parte do Estado em relação aos direitos de personalidade da criança e adolescente, destacando-se a dignidade da pessoa humana, com imposições de consequências, inclusive de ordem patrimonial, para quem adotar comportamento negligente que importe em prejuízo para o desenvolvimento moral, intelectual e psicológico de nossas crianças, contudo, com a cautela de prestigiar as consequências de ordem pedagógicas, sem que haja a monetização de todo e qualquer fato social que possa ser apontada como abandono afetivo, sob pena de criarmos uma forma de lucro injustificável sem que haja a solução do problema.

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15 Comentários

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"Mas não é a falta de amor que gera dano, não é o desamor, por si só, o ato ilícito praticado capaz de gerar o dano moral, mas sim a negativa em desferir amparo, assistência moral e psíquica, é desatender as necessidades em prejuízo da formação de uma criança, é, em muitos casos, desfazer os vínculos de afetividade já estabelecidos, é, por derradeiro, o descumprimento dos deveres decorrentes do poder familiar."

Particularmente acredito que esse vínculo de afetividade, mesmo não sendo considerado amor, é muito subjetivo e íntimo para que o Estado venha se intrometer na questão. Fora que essa afetividade não pode ser mensurada em termos financeiros, qual o parâmetro usado para a dita indenização por abandono afetivo?
Concordo plenamente que o abandono material pode e deve ser indenizado, mas o abandono afetivo não. Ao meu ver é apenas uma forma de vingança que a pessoa magoada usa para tentar atingir aquele que não quis se comprometer pessoalmente com sua criação. continuar lendo

É como criar qualquer animal, né Eloise? Coloca no cercado, dá ração e, quando chegar a hora abate.... continuar lendo

Discordo. No caso concreto foi possível sim calcular o valor do "afeto" do pai, pois ele teve outros filhos em outro casamento e foi a principal causa do sofrimento da filha que foi afetivamente abandonada. Ela, recebia única e exclusivamente 10% do salário do pai em forma de PA, enquanto os demais filhos ganham viagens, presentes, pagamento de escola, faculdade, etc. (não lembro bem os detalhes do caso).

É sim obrigação dos pais dar afeto à criança. Criança não é um brinquedo que você põe no mundo e que se dane... ou come disse a Zuleica, não é um animal que você coloca num cercado e joga ração. Acho que nem um animal merece tamanho descaso. continuar lendo

Tanto poderia ser evitado se a criança NÃO tivesse nascido...
Mas controle de natalidade não é política pública primordial (num país com tanta gente...), muitas igrejas insistem em condenar o sexo sem ser por reprodução - e condenar o uso do preservativo! - e aborto, nem se fala; fazendo a mulher (especialmente), o homem E A CRIANÇA, que não tem nada com isso; pagarem de forma proporcional por um erro cometido.
Raramente um pai ou mãe amará uma criança não desejada (não desejada MESMO, diferente da não prevista), como a cria de um relacionamento extraconjugal ou de um estupro, por mais que isso pareça cruel. É a verdade dura e cruel. O problema nunca será resolvido no judiciário. Ele deveria ser resolvido antes do nascimento. Dinheiro não compensa nem substitui falta de afeto. continuar lendo

Exatamente. É o estado encurralando os cidadãos de forma que vai do ridículo ao absurdo. Ensinem seus filhos: usem _duas_ camisinhas, tirem rapidamente, e imediatamente descartem na privada, antes que a mulher possa tocar. Ah, e não deixe que durma o namorado ou namorada muitas vezes no seu apartamento. Mini-curso de Direito que deveria ser obrigatório aos jovens. Errou, dane-se. Vai amar SIM, ou vai PAGAR. continuar lendo

E os filhos que abandonam os genitores cabe também ?? continuar lendo

A maioria dos abandonos são verificados pelo pai e geralmente a causa é a mãe que aproveita a convivência direta com o filho e a lei brasileira discriminatória que lhe favorece, pratica alienação parental "fazendo a cabeça" (interferindo na formação) da criança,
O Judiciário deve ficar atento à industrialização do dano moral para evitar o que acontecia na indústria da pensão alimentícia, felizmente em extinção com a edição da lei da guarda compartilhada. continuar lendo