Governo usa bilhões do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos para inflar o caixa
Direitos difusos são aqueles que pertencem à coletividade, a um grupo indeterminado de pessoas ligadas por uma circunstância, como consumidores afetados por um cartel ou indígenas que tiveram suas terras atingidas por barragens. As condenações por violações a esses direitos, no Brasil, resultam no pagamento de indenização ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. No entanto, o valor arrecadado, que deveria servir para a reparação dos danos, tem sido usado para a União para inflar a conta do superávit primário.
Levantamento feito pela revista eletrônica Consultor Jurídico mostra que o Fundo recebeu R$ 1,9 bilhão nos últimos sete anos, mas menos de 3% disso foram aplicados nos fins determinados em lei. O dinheiro quase todo foi para os cofres da União, pela porta dos fundos.
Só em 2016, R$ 775 milhões chegaram ao Fundo. O dinheiro vem principalmente das multas aplicadas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a empresas condenadas por formação de cartel, tendo origem também em condenações em ações civis públicas de responsabilidade por danos ao meio-ambiente, ao consumidor e aos investidores no mercado de valores mobiliários, por exemplo.
O Fundo pertence ao Ministério da Justiça e é gerido pelo Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos. Na lei, seu objetivo declarado é “a reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, por infração à ordem econômica e a outros interesses difusos e coletivos”.
Essa “reparação” deveria ser feita por meio de projetos (selecionados a partir de editais). Em 2016, oito projetos foram escolhidos e receberam R$ 2,2 milhões (clique aqui para conhecê-los). Isso significa que, levando em conta a arrecadação total, só 0,3% da verba foi usada para os fins previstos na lei. Descontando ainda o dinheiro usado para a manutenção do conselho gestor do fundo, “sobraram” mais de R$ 770 milhões, que viraram superávit primário, o resultado de todas as receitas do governo antes do pagamento da dívida pública.
O ex-presidente do conselho gestor do Fundo Fabrício Missorino Lázaro conta o que é feito com esse dinheiro: os valores que não são aplicados nos projetos nem compõem os gastos de custeio da secretaria-executiva do conselho. Vão para o orçamento geral do Ministério da Justiça, “que detém autonomia tanto para a liberação de recursos ao Conselho como para o redirecionamento dos recursos não utilizados a outras pastas que compõem o ministério”. Ou seja, o Ministério da Justiça faz o que quiser com a quantia.
Valores do FDD (em | ||
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Ano | Arrecadação | Valor usado pelo Fundo |
2010 | 30,8 | 7,9 |
2011 | 41,4 | 8,9 |
2012 | 57,0 | 5,5 |
2013 | 120,2 | 3,6 |
2014 | 192,3 | 6,3 |
2015 | 563,3 | 3,8 |
2016 | 775,0 | 2,4 |
2017* | 117,6 | indisponível |
Total* | 1.897,6 | 38,4 |
* Valor apurado em março de 2017. |
O jurista Lenio Streck, ex-procurador de Justiça do Rio Grande do Sul, após analisar o levantamento dos números feito pela ConJur, afirma: “O Ministério da Justiça deve muitas explicações”. “Temos tantas controladorias, procuradorias, tribunais de contas de tudo que é tipo e mesmo assim dão o drible da vaca na lei”, reclama.
O professor de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo Fernando Facury Scaff explica que a “permissão” para não usar o dinheiro para os fins a que o fundo se destina está no tortuoso artigo 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000). Pela norma, o Poder Executi...
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