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23 de Abril de 2024
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    Não cabe ao Senado definir alcance de decisão do Supremo

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 17 anos

    Quando o Supremo Tribunal Federal decide, de modo definitivo, que determinada lei é inconstitucional, a decisão não depende da chancela do Senado para gerar efeitos sobre as demais instâncias da Justiça. “Não é (mais) a decisão do Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa”, afirma o ministro Gilmar Mendes.

    O entendimento do ministro — que equipara o controle de constitucionalidade direto ao controle incidental — foi exposto na Reclamação ajuizada pela Defensoria Pública da União contra decisão da Vara de Execuções Penais de Rio Branco. Os defensores afirmaram que o juiz, ao não avaliar pedido de progressão de regime para dez condenados por crimes hediondos, desobedeceu a decisão do STF que considerou inconstitucional a proibição da progressão.

    Em sua justificativa, o juiz sustentou que, por ter sido tomada em um pedido de Habeas Corpus, a decisão do Supremo gerava efeitos apenas para aquele caso específico. “Para que venha a ter eficácia para todos é necessária a comunicação da Corte Suprema ao Senado Federal, que, a seu critério, pode suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal (art. 52, X, da CF)”, argumentou o juiz.

    Ainda de acordo com o juiz de Rio Branco, “se a decisão do Supremo Tribunal Federal tivesse sido tomada em sede de ação direta de inconstitucionalidade (controle concentrado), produziria eficácia contra todos e efeito vinculante, relativa aos demais órgãos do Judiciário e até à Administração Pública direta e indireta”. Como não foi em ADI, dependeria do ato do Senado.

    Ao analisar o caso nesta quinta-feira (1/2), o ministro Gilmar Mendes rejeitou os argumentos do juiz. Num extenso voto, em que analisa o papel do Senado no controle de constitucionalidade, o ministro sustenta que o ato de suspender a execução da lei não é adequado para assegurar que a decisão do Supremo seja aplicada ou gere efeito vinculante.

    Segundo Gilmar Mendes, o Senado não pode “restringir ou ampliar a extensão do julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal”. Assim, a suspensão da execução da lei tem apenas o efeito de dar publicidade à decisão da Corte. Gilmar aponta que cabe ao tribunal definir os efeitos da decisão.

    “Se o Supremo Tribunal pode, em ação direta de inconstitucionalidade, suspender, liminarmente, a eficácia de uma lei, até mesmo de uma Emenda Constitucional, por que haveria a declaração de inconstitucionalidade, proferida no controle incidental, valer tão-somente para as partes?”, questiona o ministro. E responde: “a única resposta plausível nos leva a crer que o instituto da suspensão pelo Senado assenta-se hoje em razão de índole exclusivamente histórica”.

    De acordo com Gilmar Mendes, “a natureza idêntica do controle de constitucionalidade, quanto às suas finalidades e aos procedimentos comuns dominantes para os modelos difuso e concentrado, não mais parece legitimar a distinção quanto aos efeitos das decisões proferidas no controle direto e no controle incidental”.

    O julgamento da questão pelo plenário do Supremo foi suspenso por pedido de vista do ministro Eros Grau. O ministro Gilmar Mendes, relator, foi o único que votou até agora.

    Texto corrigido às 16 horas desta sexta-feira (2/2)


    Leia o voto:


    RECLAMAÇÃO 4.335-5 ACRE

    RELATOR

    MIN. GILMAR MENDES

    RECLAMANTE

    DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

    RECLAMADO

    JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DA COMARCA DE RIO BRANCO (PROCESSOS NºS 00102017345-9, 00105012072-8, 00105017431-3, 00104000312-5, 00105015656-2, 00105013247-5, 00102007288-1, 00106003977-0, 00105014278-0 E 00105007298-7)

    INTERESSADO

    ODILON ANTONIO DA SILVA LOPES

    INTERESSADO

    ANTONIO EDINEZIO DE OLIVEIRA LEÃO

    INTERESSADO

    SILVINHO SILVA DE MIRANDA

    INTERESSADO

    DORIAN ROBERTO CAVALCANTE BRAGA

    INTERESSADO

    RAIMUNDO PIMENTEL SOARES

    INTERESSADO

    DEIRES JHANES SARAIVA DE QUEIROZ

    INTERESSADO

    ANTONIO FERREIRA DA SILVA

    INTERESSADO

    GESSYFRAN MARTINS CAVALCANTE

    INTERESSADO

    JOÃO ALVES DA SILVA

    INTERESSADO

    ANDRÉ RICHARDE NASCIMENTO DE SOUZA


    R E L A T Ó R I O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - (Relator):

    Trata-se de reclamação, ajuizada pela Defensoria Pública do Estado do Acre, em face de decisão do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco, no Estado do Acre, que indeferiu o pedido de progressão de regime em favor de ODILON ANTONIO DA SILVA LOPES, ANTONIO EDINEZIO DE OLIVEIRA LEÃO, SILVINHO SILVA DE MIRANDA, DORIAN ROBERTO CAVALCANTE BRAGA, RAIMUNDO PIMENTEL SOARES, DEIRES JHANES SARAIVA DE QUEIROZ, ANTONIO FERREIRA DA SILVA, GESSYFRAN MARTINS CAVALCANTE, JOÃO ALVES DA SILVA E ANDRÉ RICHARDE NASCIMENTO DE SOUZA.

    Alega-se que os condenados apontados pelo reclamante cumprem penas de reclusão em regime integralmente fechado, em decorrência da prática de crimes hediondos.

    O reclamante alega o descumprimento da decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 82.959, da relatoria do Ministro Marco Aurélio, quando a Corte afastou a vedação de progressão de regime aos condenados pela prática de crimes hediondos, ao considerar inconstitucional o artigo , § 1º, da Lei n. 8.072/1990 (“Lei dos Crimes Hediondos”).

    Com base no referido julgamento, solicitou o reclamante fosse concedida progressão de regime aos apenados relacionados acima. Tal pedido foi indeferido pelo Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco/AC, sob a alegação de vedação legal para admiti-la e o seguinte argumento:

    “ (...) conquanto o Plenário do Supremo Tribunal, em maioria apertada (6 votos x 5 votos), tenha declarado ‘incidenter tantum’ a inconstitucionalidade do art. 2o, § 1o da Lei 8.072/90 (Crimes Hediondos), por via do Habeas Corpus n. 82.959, isto após dezesseis anos dizendo que a norma era constitucional, perfilho-me a melhor doutrina constitucional pátria que entende que no controle difuso de constitucionalidade a decisão produz efeitos ‘inter partes’.”(fl.23-24).

    Da denegação do pedido de progressão por parte do juízo a quo, o reclamante impetrou habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Estado do Acre (fl.4-12).

    Solicitei informações à autoridade reclamada, o Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco/AC, que assim se manifestou na Petição n. 72.377/2006 (fls. 20-25):

    “Inicialmente, opino pelo não conhecimento da reclamação, posto que não preenchidos os requisitos do art. 13, da Lei n. 8.038/90.

    Sendo o pedido de progressão de regime da competência da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco, vez que na Comarca cumprem pena os interessados na Reclamação, não há que se falar em preservar a competência dessa E. Corte; por outra, não é de conhecimento deste Juízo, até o momento, que o STF tenha expedido ordem em favor de um dos interessados na reclamação, e, portanto, não é hipótese de garantir a autoridade de decisão da Corte.

    Por outra, a reclamação não foi regularmente instruída com os documentos necessários, talvez pelos motivos apontados no parágrafo anterior, e indicam claramente que busca suprimir instância, posto que conforme consta da inicial, contra a decisão deste Juízo que negou a progressão para aqueles apenados por crimes hediondos ou equiparados manejou o reclamante habeas corpus perante o Tribunal de Justiça do Estado do Acre.

    Quanto ao pedido, tenho a informar que efetivamente tramitam neste Juízo os autos das execuções penais ns. 001.02.017345-9, 001.05.012072-8, 001.05.017431-3, 001.04.000312-5, 001.05.015656-2, 001.05.013247-5, 001.02.007288-1, 001.06.003977-0, 001.05.014278-0 e 001.05.007298-7, cujos reeducandos figuram como interessados na reclamação, e me permito reproduzir parcialmente as informações prestadas ao Tribunal de Justiça do Estado do ACRE quando oficiado a prestá-las, que são do seguinte teor:

    Sobre as alegações constantes no ‘habeas corpus’, forçoso dizer que o impetrante lançou mão de argumentos que não correspondem à verdade.

    No afã de conseguir seu intento, talvez tenha o impetrante esquecido que este Juízo, conforme determinado pelas Portarias ns. 07 e 09 da Corregedoria Geral da Justiça deste Estado, teve o seu expediente externo suspenso em função do cadastramento dos processos de execução no Programa SAJ de informatização de 13 a 31 de março passado.

    No referido período, todos os prazos processuais foram suspensos, a fim de evitar prejuízo a qualquer das partes, e obviamente, restou prejudicada a tramitação dos feitos, isto porque os próprios servidores lotados na Vara de Execuções Penais - VEP executaram toda a árdua tarefa de cadastrar um a um os processos.

    Assim, com o fim do cadastramento e o reinício dos trabalhos, em três de abril passado, deu-se continuidade à tramitação dos procedimentos de execução, sendo portanto os feitos encaminhados ao Ministério Público, a fim de se colher o necessário parecer sobre o pedido.

    Particularmente quanto ao pedido de progressão de regime do 7º paciente, verifica-se que o mesmo foi objeto de julgamento no dia 25/04/2006 (decisão de indeferimento do pedido de progressão).

    É latente a falta de diligência do nobre defensor ao impetrar o presente writ ao 1º paciente (Odilon Antônio da Silva Lopes) que sequer tem execução em andamento nesta VEP, e aos 3º, 5º, 6º e 10º pacientes que cumprem pena por crimes comuns, tendo este último sido condenado no regime semi-aberto.

    Devo frisar ainda, que causa espécie a alegação de que este Magistrado tenha se eximido de decidir com base em comunicado que fiz veicular no presente fórum.

    Tal comunicado foi veiculado única e exclusivamente com o fim de evitar o número cada vez crescente de atendimentos solicitando informações sobre o julgamento do STF perante esta VEP, e nada mais fez a não ser repassar a informação constante no site do próprio STF quando do julgamento do HC 82959 (anexo), que tem o seguinte teor:

    "Como a decisão se deu no controle difuso de constitucionalidade (análise dos efeitos da lei no caso concreto), a decisão do Supremo terá que ser comunicada ao Senado para que o parlamento providencie a suspensão da eficácia do dispositivo declarado inconstitucional. (...)” (in site www.stf gov.br, notícias de 23.02.2006, cujo tema é 23/02/2006 - 19:05 - Supremo afasta a proibição de progressão de regime nos crimes hediondos - 3º parágrafo.)

    Em momento algum este Magistrado deixou de decidir o feito com base no comunicado, posto que tal comunicado não foi juntado a qualquer processo, basicamente por não se constituir em ato judicial processual.

    O atraso deu-se unicamente em razão da suspensão do expediente externo, conforme apontado.

    Quanto à decisão do STF de declarar inconstitucional o artigo da Lei 8.072/90 que veda a progressão de regime de cumprimento de pena para condenados por crimes hediondos e equiparados, é pacífico que, tratando-se de controle difuso de constitucionalidade, somente tem efeitos entre as partes.

    Para que venha a ter eficácia para todos é necessária a comunicação da Corte Suprema ao Senado Federal, que, a seu critério, pode suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal (art. 52, X, da CF).

    Sobre o tema, verifica-se do Regimento Interno do STF:

    "Art. 178. Declarada, incidentalmente, a inconstitucionalidade, na forma prevista nos artigos 176 e 177, far-se-á a comunicação, logo após a decisão, à autoridade ou órgão interessado, bem como, depois do trânsito em julgado, ao Senado Federal, para os efeitos do art. 42, VII, da Constituição.”

    Assim, não havendo qualquer notícia de que o Senado Federal tenha sido comunicado e que tenha suspendido a eficácia do artigo declarado incidenter tantum inconstitucional, o que se tem até a presente data é que ainda está em vigor o art. , § 1º, da Lei 8.072/90, que veda a progressão de regime.

    Se a decisão do Supremo Tribunal Federal tivesse sido tomada em sede de ação direta de inconstitucionalidade (controle concentrado), produziria eficácia contra todos e efeito vinculante, relativa aos demais órgãos do Judiciário e até à Administração Pública direta e indireta, nos exatos termos do art. 102, § 2º, da Constituição Federal. Todavia, como dito, não foi o que se verificou - a decisão se deu no controle difuso.

    A remansosa e respeitada doutrina nacional tem pacificado esse entendimento sobre as formas de controle de constitucionalidade.

    De outro lado, este Juízo não tem competência para modificar o título executivo judicial com base em decisão judicial, mesmo que seja do Supremo Tribunal Federal.

    A lei confere este poder ao Juiz da Vara de Execuções Penais somente no caso de lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado (art. 66, I, da Lei de Execução Penal), e este não é o caso.

    Para melhor elucidar, transcrevo a decisão relativa a negativa de progressão de regime aos pacientes, cujos processos já foram julgados.

    "Vistos, etc.

    O reeducando epigrafado ingressou com o pedido de progressão de regime.

    Os autos vieram instruídos com a liquidação de pena, o relatório carcerário e a certidão de antecedentes criminais.

    Instado, o Ministério Público manifestou-se pelo indeferimento do pedido de progressão de regime por falta de amparo legal, ante a vigência do art. , § 1º da Lei 8.072/90, colacionando julgado do Tribunal de Justiça de Goiás.

    É o breve relatório. Decido.

    Compulsando os autos, ao analisar o pedido de progressão, em se tratando de execução de pena por crime hediondo, tenho que há vedação legal para admiti-la.

    Conquanto o Plenário do Supremo Tribunal, em maioria apertada (6 votos x 5 votos), tenha declarado ‘incidenter tantum’ a inconstitucíonalidade do art. 2.º, § 1.º da Lei 8.0721/90 (Lei dos Crimes Hediondos), por via do Habeas Corpus n. 82.959, isto após dezesseis anos dizendo que a norma era constitucional, perfilho-me a melhor doutrina constitucional pátria, que entende que no controle difuso de constitucionalidade a decisão produz efeitos inter partes. Para que se estenda os seus efeitos erga omnes, a decisão deve ser comunicada ao Senado Federal, que discricionariamente editará resolução suspendendo o dispositivo legal declarado inconstitucional pelo Pretório Excelso (conforme, aliás, o próprio STF informou em seu site na internet, em notícia publicada no dia 23/02/2006, que é do seguinte teor:"...Como a decisão se deu no controle difuso de constitucionalidade (análise dos efeitos da lei no caso concreto), a decisão do Supremo terá que ser comunicada ao Senado para que o parlamento providencie a suspensão da eficácia do dispositivo declarado inconstitucional...").

    A referida decisão operou-se para solução de determinado caso concreto, no controle difuso de constitucionalidade, sem a análise da lei em tese. Significa dizer que os seus efeitos se aplicam somente entre as partes do processo, e mesmo que suspensa a eficácia da lei pelo Senado Federal, no tempo, os efeitos se operam ‘ex nunc’. Diversamente, na declaração de inconstítucionalidade por via do controle abstrato, analisa-se a lei e a Constituição sem qualquer referência a um caso concreto e seus efeitos atingem a todos, vinculando Juízes e Tribunais. Nestes casos, o STF decide se seus efeitos podem atingir questões passadas, ou seja, se operam ex tunc. Entender de outra forma seria negar vigência ao disposto no art. 52, inc. X, da Constituição Federal, contrariando o sistema constitucional adotado, ou seja o ‘check and balances’, ou freios e contrapesos, inspirado no modelo norte americano, onde um Poder é controlado pelo outro. Dito isto, o que continua líquido e certo até o momento, ante a inércia dos Poderes em fazer valer o disposto no art. 52, inc. X, da CF/88, é a eficácia do dispositivo da Lei dos Crimes Hediondos (art. , § 1º, da Lei n. 8.072/90) que veda a progressão de regime aos crimes hediondos ou a eles equiparados.

    Neste contexto, é sabido que compete ao Juízo da Execução Penal aplicar aos casos julgados a lei posterior de que qualquer modo favorecer o condenado (art. 66, I, da LEP, e Súmula n. 611 do STF), contudo até o momento não há lei nova que favoreça aqueles que se encontram cumprindo pena pela prática de delitos hediondos ou assim equiparados.

    Ao Juiz da Vara de Execuções Penais cabe dar cumprimento à coisa julgada e não desrespeitá-la, a pretexto de decisão que não vincula juízes ou Tribunais, como já dito.

    Para rescindir a coisa julgada fora da hipótese de lei nova em benefício do reeducando (autorizada ao Juízo da Execução Penal), necessário que instância superior processe e julgue revisão criminal, ou o faça por meio de ‘habeas corpus’, ou mesmo que declare ‘incidenter tantum’ a inconstitucionalidade de dispositivo legal. Isto posto, com fundamento no art. , § 1º, da Lei n. 8.072/90 e nos arts. e 52, inc. X, da Constituição Federal, INDEFIRO o pedido de progressão de regime ao reeducando Antonio Aluizio Alves da Silva, ante a sua impossibilidade jurídica.(...)” (fls. 20-25).

    Em decisao de 21.8.2006, concedi medida liminar, para que, mantido o regime fechado de cumprimento de pena por crime hediondo, fosse afastada a vedação legal de progressão de regime, até o julgamento final desta reclamação (fl.33-44).

    A Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra da Subprocuradora-Geral da República, Cláudia Sampaio Marques (fls. 30-31), opinou pelo não-conhecimento do pedido, em virtude de inexistir decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal cuja autoridade deva ser preservada, e, portanto, ser manifestamente descabida a presente reclamação.

    É o relatório.


    RECLAMAÇÃO 4.335-5 ACRE

    V O T O

    O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - (Relator):

    No HC 82.959-SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em sessão plenária de 23.2.2006, DJ de 1o.9.2006, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do artigo 2o, § 1o, da Lei no 8.072/90 (“Lei dos Crimes Hediondos”), que vedava a progressão de regime em casos de crimes hediondos, em acórdão assim ementado:

    PENA – REGIME DE CUMPRIMENTO – PROGRESSÃO – RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social.

    PENA – CRIMES HEDIONDOS – REGIME DE CUMPRIMENTO – PROGRESSÃO – ÓBICE – ARTIGO 2o, § 1o, DA LEI No 8.072/90 – INCONSTITUCIONALIDADE – EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena – artigo 5o, inciso XLVI, da Constituição Federal – a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2o, § 1o, da Lei no 8.072/90.

    Alega o reclamante que, em 2.3.2006, o reclamado fez afixar comunicado em vários pontos das dependências do Fórum de Rio Branco - Acre, nos seguintes termos:

    Comunico aos senhores reeducandos, familiares, advogados e comunidade em geral, que A RECENTE DECISÃO PLENÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL proferida nos autos do ‘habeas corpus’ no 82.959, A QUAL DECLAROU A INCONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO DA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS QUE VEDAVA A PROGRESSAO DE REGIME PRISIONAL (ART. 2o, § 1o DA Lei 8.072/90), SOMENTE TERÁ EFICÁCIA A FAVOR DE TODOS OS CONDENADOS POR CRIMES HEDIONDOS OU A ELES EQUIPARADOS QUE ESTEJAM CUMPRINDO PENA, a partir da expedição, PELO SENADO FEDERAL, DE RESOLUÇÃO SUSPENDENDO A EFICÁCIA DO DISPOSITIVO DE LEI declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 52, inciso X, da Constituição Federal. Rio Branco, 02 de março de 2.006. Marcelo Coelho de Carvalho Juiz de Direito.” (fl.05-06).

    Preliminarmente, anote-se que não se trata, na espécie, de reclamação incabível, sob o argumento de inexistência de decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal cuja autoridade deva ser preservada, conforme aponta o parecer do Ministério Público Federal:

    3. A reclamação é o instrumento processual constitucionalmente instituído para a finalidade específica de preservar a competência dos tribunais e garantir a autoridade dos seus julgados.

    4. Ao Supremo Tribunal Federal compete processar e julgar as reclamações que visem a preservar a competência do próprio Supremo Tribunal Federal e a autoridade de suas decisões, proferidas em feitos de sua competência originária ou recursal.

    5. De acordo com pesquisa feita no site dessa Corte, não consta o registro de ‘habeas corpus’ impetrado pelo Reclamante em favor das pessoas relacionadas no documento de fls. 4 destes autos, sendo certo que o Reclamante não instruiu o seu pedido com um único documento que comprovasse a sua afirmação de que o Juiz de Direito da Vara de Execução Penais de Rio Branco estaria se negando a cumprir decisão proferida em favor de presos condenados por crimes hediondos.

    6. Esse fato foi confirmado pela ilustre autoridade impetrada, em suas informações, quando afirmou que “não é do conhecimento deste Juízo, até o momento, que o STF tenha expedido ordem em favor de um dos interessados na reclamação e, portanto, não é hipótese de garantir a autoridade de decisão da Corte” (fl.20).

    7. Assim, não existindo decisão proferida por essa Corte cuja autoridade deva ser preservada, a reclamação é manifestamente descabida.” (fl.30-31)

    A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal deu sinais de grande evolução no que se refere à utilização do instituto da reclamação em sede de controle concentrado de normas. No julgamento da questão de ordem em agravo regimental na Rcl 1.880, em 23 de maio de 2002, o Tribunal restou assente o cabimento da reclamação para todos aqueles que comprovarem prejuízo resultante de decisões contrárias às teses do STF, em reconhecimento à eficácia vinculante erga omnes das decisões de mérito proferidas em sede de controle concentrado.

    Tal decisão restou assim ementada:

    “QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DE MÉRITO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 28 DA LEI No 9.868/99: CONSTITUCIONALIDADE. EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO. REFLEXOS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA.

    [...]

    4. Reclamação. Reconhecimento de legitimidade ativa ‘ad causam’ de todos que comprovem prejuízo oriundo de decisões dos órgãos do Poder Judiciário, bem como da Administração Pública de todos os níveis, contrárias ao julgado do Tribunal. Ampliação do conceito de parte interessada (Lei no 8.038/90, artigo 13). Reflexos processuais da eficácia vinculante do acórdão a ser preservado.

    [...]”[1]

    Entendo que, para analisar o tema, é necessário investigar se o instrumento da reclamação foi, no presente caso, utilizado em consonância com a sua destinação constitucional: a garantia da autoridade das decisões do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, l, da CF/88), no caso, a do HC 82.959/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 1o.9.2006.

    Superada essa questão, caberá analisar a afirmação do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Rio Branco - Acre de que a referida decisão no HC 82.959/SP “somente terá eficácia a favor de todos os condenados por crimes hediondos ou a eles equiparados que estejam cumprindo pena, a partir da expedição, pelo Senado Federal, de resolução suspendendo a eficácia do dispositivo de lei declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 52, inciso X, da Constituição Federal”.

    Para apreciar a dimensão constitucional do tema, gostaria de tecer alguns comentários sobre o papel do Senado Federal no controle de constitucionalidade.

    - Introdução

    A suspensão da execução pelo Senado Federal do ato declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal foi a forma definida pelo constituinte para emprestar eficácia erga omnes às decisões definitivas sobre inconstitucionalidade.

    A aparente originalidade da fórmula tem dificultado o seu enquadramento dogmático. Discute-se, assim, sobre os efeitos e a natureza da resolução do Senado Federal que declare suspensa a execução da lei ou ato normativo. Questiona-se, igualmente, sobre o caráter vinculado ou discricionário do ato praticado pelo Senado e sobre a abrangência das leis estaduais e municipais. Indaga-se, ainda, sobre a pertinência da suspensão ao pronunciamento de inconstitucionalidade incidenter tantum, ou sobre a sua aplicação às decisões proferidas em ação direta.

    Embora a doutrina pátria reiterasse os ensinamentos teóricos e jurisprudenciais americanos, no sentido da inexistência jurídica ou da ampla ineficácia da lei declarada inconstitucional, não se indicava a razão ou o fundamento desse efeito amplo. Diversamente, a não-aplicação da lei, no Direito norte-americano, constitui expressão do stare decisis, que empresta efeitos vinculantes às decisões das Cortes Superiores. Daí, ter-se adotado, em 1934, a suspensão de execução pelo Senado como mecanismo destinado a outorgar generalidade à declaração de inconstitucionalidade. A engenhosa fórmula mereceu reparos na própria Assembléia Constituinte. O Deputado Godofredo Vianna pretendeu que se reconhecesse, v.g., a inexistência jurídica da lei, após o segundo pronunciamento do Supremo Tribunal Federal sobre a inconstitucionalidade do diploma.[2]

    Mas que efeitos haveriam de se reconhecer ao ato do Senado que suspende a execução da lei inconstitucional?

    Lúcio Bittencourt afirmava que “o objetivo do art. 45, n. IV – a referência diz respeito à Constituição de 1967é apenas tornar pública a decisão do tribunal, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos”[3]. Outros reconhecem que o Senado Federal pratica ato político que “confere efeito geral ao que era particular (...), generaliza os efeitos da decisão”[4].

    O Supremo Tribunal Federal parece ter admitido, inicialmente, que o ato do Senado emprestava eficácia genérica à decisão definitiva. Assim, a suspensão tinha o condão de dar alcance normativo ao julgado do Supremo Tribunal Federal.[5]

    Mas qual era a dimensão dessa eficácia ampla? Seria a de reconhecer efeito retroativo ao ato do Senado Federal?

    Também aqui não se logravam sufrágios unânimes.

    Themístocles Cavalcanti responde negativamente, sustentando que a “única solução que atende aos interesses de ordem pública é que a suspensão produzirá os seus efeitos desde a sua efetivação, não atingindo as situações jurídicas criadas sob a sua vigência”[6]. Da mesma forma, Bandeira de Mello ensina que “a suspensão da lei corresponde à revogação da lei”, devendo “ser respeitadas as situações anteriores definitivamente constituídas, porquanto a revogação tem efeito ex nunc” [7]. Enfatiza que a suspensão “não alcança os atos jurídicos formalmente perfeitos, praticados no passado, e os fatos consumados, ante sua irretroatividade, e mesmo os efeitos futuros dos direitos regularmente adquiridos”. “O Senado Federal – assevera Bandeira de Mello – apenas cassa a lei, que deixa de obrigar, e, assim, perde a sua executoriedade porque, dessa data em diante, a revoga simplesmente”[8].

    Não obstante a autoridade dos seus sectários, essa doutrina parecia confrontar com as premissas basilares da declaração de inconstitucionalidade no Direito brasileiro.

    Afirmava-se quase incontestadamente, entre nós, que a pronúncia da inconstitucionalidade tinha efeito ex tunc, contendo a decisão judicial caráter eminentemente declaratório.[9] Se assim fora, afigurava-se inconcebível cogitar de “situações juridicamente criadas”, de “atos jurídicos formalmente perfeitos” ou de “efeitos futuros dos direitos regularmente adquiridos”, com fundamento em lei inconstitucional. De resto, é fácil de ver que a constitucionalidade da lei parece constituir pressuposto inarredável de categorias como as do direito adquirido e do ato jurídico perfeito.

    É verdade que a expressão utilizada pelo constituinte de 1934 (art. 91, IV) e reiterada nos textos de 1946 (art. 64), de 1967/1969 (art. 42, VII) e de 1988 (art. 52, X) – suspender a execução de lei ou decreto – não é isenta de dúvida.[10] Originariamente, o substitutivo da Comissão Constitucional que produziu o modelo da Constituição de 1934 chegou a referir-se à “revogação ou suspensão da lei ou ato”[11]. Mas a própria ratio do dispositivo não autorizava a equiparação do ato do Senado a uma declaração de ineficácia de caráter prospectivo. A proposta de Godofredo Vianna reconhecia a inexistência jurídica da lei, desde que fosse declarada a sua inconstitucionalidade “em mais de um aresto” do Supremo Tribunal Federal. Nos debates realizados preponderou, porém, a idéia de se outorgar ao Senado, erigido, então, ao papel de coordenador dos poderes, a suspensão da lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

    Na discussão travada no Plenário da Constituinte, destacaram-se as objeções de Levi Carneiro, contrário à incorporação do instituto ao Texto Magno. Prevaleceu a tese perfilhada, dentre outras, por Prado Kelly, tal como resumida na seguinte passagem:

    Na sistemática preferida pelo nobre Deputado, Sr. Levi Carneiro, o Supremo Tribunal decretaria a inconstitucionalidade de uma lei, e os efeitos dessa decisão se limitariam às partes em litígio. Todos os demais cidadãos, que estivessem na mesma situação da que foi tutelada num processo próprio, estariam ao desamparo da lei. Ocorreria, assim, que a Constituição teria sido defendida na hipótese que permitiu o exame do Judiciário, e esquecida, anulada, postergada em todos os outros casos (...)”.

    Certas constituições modernas têm criado cortes jurisdicionais para defesa da Constituição. Nós continuamos a atribuir à Suprema Corte a palavra definitiva da defesa e guarda da Constituição da República. Entretanto permitimos a um órgão de supremacia política estender os efeitos dessa decisão, e estendê-los para o fim de suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando o Poder Judiciário os declara inconstitucionais.”[12]

    Na Assembléia Constituinte de 1946, reencetou-se o debate, tendo-se destacado, uma vez mais, na defesa do instituto, a voz de Prado Kelly:

    O Poder Judiciário só decide em espécie.É necessário, porém, estender os efeitos do julgado, e esta é atribuição do Senado.

    Quanto ao primeiro ponto, quero lembrar que na Constituição de 34 existe idêntico dispositivo.

    Participei da elaboração da Constituição de 34. De fato, tentou-se a criação de um quarto poder; entretanto já há muito o Senado exercia a função controladora, fiscalizadora do Poder Executivo.

    O regime democrático é um regime de legalidade. No momento em que o Poder Executivo pratica uma ilegalidade, a pretexto de regulamentar uma lei votada pelo Congresso, exorbita nas suas funções. Há a esfera do Judiciário, e este não está impedido, desde que é violado o direito patrimonial do indivíduo, de apreciar o direito ferido.

    Se, entretanto, se reserva ao órgão do Poder Legislativo, no caso o Senado, a atribuição fiscalizadora da lei, não estamos diante de uma função judicante, mas de fiscal do arbítrio do Poder Executivo. O dispositivo já constava da Constituição de 34 e não foi impugnado por nenhum autor ou comentador que seja do meu conhecimento. Ao contrário, foi um dos dispositivos mas festejados pela crítica, porque atendia, de fato, às solicitações do meio político brasileiro.”[13]

    Ante as críticas tecidas por Gustavo Capanema, ressaltou Nereu Ramos que:

    A lei ou regulamentos declarados inconstitucionais são juridicamente inexistentes entre os litigantes. Uma vez declarados, pelo Poder Judiciário, inconstitucionais ou ilegais, a decisão apenas produz efeito entre as partes. Para evitar que os outros interessados, amanhã, tenham de recorrer também ao Judiciário, para obter a mesma coisa, atribui-se ao Senado a faculdade de suspender o ato no todo ou em parte, quando o Judiciário haja declarado inconstitucional, porque desde que o Judiciário declara inconstitucional, o Presidente da República não pode declarar constitucional.”[14]

    Parecia evidente aos constituintes que a suspensão da execução da lei, tal como adotada em 1934, importava na extensão dos efeitos do aresto declaratório da inconstitucionalidade, configurando, inclusive, instrumento de economia processual. Atribuía-se, pois, ao ato do Senado, caráter ampliativo e não apenas paralisante ou derrogatório do diploma viciado. E, não fosse assim, inócuo seria o instituto com referência à maioria das situações formadas na vigência da lei declarada inconstitucional.

    Percebeu essa realidade o Senador Accioly Filho, que defendeu a seguinte orientação:

    Posto em face de uma decisão do STF, que declara a inconstitucionalidade de lei ou decreto, ao Senado não cabe tão-só a tarefa de promulgador desse decisório.

    A declaração é do Supremo, mas a suspensão é do Senado. Sem a declaração, o Senado não se movimenta, pois não lhe é dado suspender a execução de lei ou decreto não declarado inconstitucional. Essa suspensão é mais do que a revogação da lei ou decreto, tanto pelas suas conseqüências quanto por desnecessitar da concordância da outra Casa do Congresso e da sanção do Poder Executivo. Em suas conseqüências, a suspensão vai muito além da revogação. Esta opera ‘ex nunc’, alcança a lei ou ato revogado só a partir da vigência do ato revogador, não tem olhos para trás e, assim, não desconstitui as situações constituídas enquanto vigorou o ato derrogado. Já quando de suspensão se trate, o efeito é ‘ex tunc’, pois aquilo que é inconstitucional é natimorto, não teve vida (cf. Alfredo Buzaid e Francisco Campos), e, por isso, não produz efeitos, e aqueles que porventura ocorreram ficam desconstituídos desde as suas raízes, como se não tivessem existido.

    Integra-se, assim, o Senado numa tarefa comum com o STF, equivalente àquela da alta Corte Constitucional da Áustria, do Tribunal Constitucional alemão e da Corte Constitucional italiana. Ambos, Supremo e Senado, realizam, na Federação brasileira, a atribuição que é dada a essas Cortes européias.

    Ao Supremo cabe julgar da inconstitucionalidade das leis ou atos, emitindo a decisão declaratória quando consegue atingir o ‘quorum’ qualificado.

    Todavia, aí não se exaure o episódio se aquilo que se deseja é dar efeitos ‘erga omnes’ à decisão.

    A declaração de inconstitucionalidade, só por ela, não tem a virtude de produzir o desaparecimento da lei ou ato, não o apaga, eis que fica a produzir efeitos fora da relação processual em que se proferiu a decisão.

    Do mesmo modo, a revogação da lei ou decreto não tem o alcance e a profundidade da suspensão. Consoante já se mostrou, e é tendência no direito brasileiro, só a suspensão por declaração de inconstitucionalidade opera efeito ‘ex tunc’, ao passo que a revogação tem eficácia só a partir da data de sua vigência.

    Assim, é diferente a revogação de uma lei da suspensão de sua vigência por inconstitucionalidade.”[15]

    Adiante, o insigne parlamentar concluía:

    Revogada uma lei, ela continua sendo aplicada, no entanto, às situações constituídas antes da revogação (art. 153, § 3o, da Constituição). Os juízes e a administração aplicam-na aos atos que se realizaram sob o império de sua vigência, porque então ela era a norma jurídica eficaz. Ainda continua a viver a lei revogada para essa aplicação, continua a ter existência para ser utilizada nas relações jurídicas pretéritas (...)

    A suspensão por declaração de inconstitucionalidade, ao contrário, vale por fulminar, desde o instante do nascimento, a lei ou decreto inconstitucional, importa manifestar que essa lei ou decreto não existiu, não produziu efeitos válidos.

    A revogação, ao contrário disso, importa proclamar que, a partir dela, o revogado não tem mais eficácia.

    A suspensão por declaração de inconstitucionalidade diz que a lei ou decreto suspenso nunca existiu, nem antes nem depois da suspensão.

    Há, pois, distância a separar o conceito de revogação daquele da suspensão de execução de lei ou decreto declarado inconstitucional. O ato de revogação, pois, não supre o de suspensão, não o impede, porque não produz os mesmos efeitos.”[16]

    Essa colocação parecia explicitar a natureza singular da atribuição deferida ao Senado Federal sob as Constituições de 1946 e de 1967/69. A suspensão constituía ato político que retira a lei do ordenamento jurídico, de forma definitiva e com efeitos retroativos. É o que ressaltava, igualmente, o Supremo Tribunal Federal ao enfatizar que “a suspensão da vigência da lei por inconstitucionalidade torna sem efeito todos os atos praticados sob o império da lei inconstitucional.”[17]

    Vale recordar, a propósito, que no MS 16.512[18], o Supremo Tribunal Federal teve a oportunidade de discutir largamente a natureza do instituto, infirmando a possibilidade de o Senado Federal revogar o ato de suspensão anteriormente editado, ou de restringir o alcance da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Cuidava-se de Mandado de Segurança impetrado por “Engenharia Souza e Barker Ltda. e outros” contra a Resolução n. 93, de 14 de outubro de 1965, que revogou a Resolução anterior (n. 32, de 25.3.1965), pela qual o Senado suspendera a execução de preceito do Código Paulista de Impostos e Taxas.

    O Supremo Tribunal Federal pronunciou a inconstitucionalidade da resolução revogadora, contra os votos dos Ministros Aliomar Baleeiro e Hermes Lima, conhecendo do mandado de segurança como representação de inconstitucionalidade, tal como proposto pelo Procurador-Geral da República, Dr. Alcino Salazar.[19]

    Ademais, reconheceu que o Senado não estava obrigado a proceder à suspensão do ato declarado inconstitucional. Nessa linha de entendimento, ensinava o Ministro Victor Nunes:

    “(...) o Senado terá seu próprio critério de conveniência e oportunidade para praticar o ato de suspensão. Se uma questão foi aqui decidida por maioria escassa e novos Ministros são nomeados, como há pouco aconteceu, é de todo razoável que o...






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