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25 de Abril de 2024

A Defensoria Pública e a hipossuficiência jurídica no processo penal

Publicado por Consultor Jurídico
há 9 anos

A importância da Defensoria Pública no acesso à justiça penal
O modelo institucional da Defensoria Pública no Brasil é objeto de estudo e destaque na Organização das Nações Unidas (ONU)[1]. Da mesma forma, a Organização dos Estados Americanos (OEA) já editou quatro Resoluções exaltando a importância não somente da Defensoria Pública “oficial” como garantia de acesso à justiça, mas também da necessidade de se lhe outorgar autonomia[2]. Recentemente, ainda, a Comissão Nacional da Verdade, numa de suas Recomendações, ressaltou a importância do “Fortalecimento das Defensorias Públicas”[3]. A CF/88, por sua vez, alterada pela EC 80/2014, eleva a Defensoria Pública ao patamar de “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado (...)”. Resumindo bem este panorama, Zaffaroni conclui que “pode se afirmar que o grau de realização do Estado de Direito em nossa região está dado pela autonomia e o poder da Defensoria Pública em comparação com outras agências do sistema penal”[4].

Diversos juristas europeus ressentem a inexistência da Defensoria Pública na Europa. Ferrajoli, por exemplo, vê na Defensoria “um dos aportes mais significativos da experiência jurídica latino-americana”, afirmando se tratar de um “modelo de civilidade para o mundo, sobretudo para a Europa”[5]. No mesmo sentido, Schünemann, um dos mais destacados penalistas alemães, enxerga na Defensoria Pública brasileira “um interessante modelo a ser estudado pelo processo penal dos países europeus”[6].

Tal introdução se mostra necessária no Brasil, onde o trabalho da Defensoria Pública no acesso à justiça penal não costuma ser muito bem compreendido[7], além do fato de que a fama internacional do modelo institucionalizado não raramente é sufocada por um desprezo nacional, que reserva à Defensoria a condição de “prima pobre” da Magistratura e do Ministério Público. Para a presente ocasião, faço o recorte temático e enfrento somente os seguintes questionamentos: quando o acusado, no processo penal, tendo condições financeiras, não constitui advogado, quem deve defendê-lo? Um advogado dativo ou um defensor público? E mais, a assistência jurídica compulsória, privada ou pública, deve ser paga pelo acusado? Vejamos.

Três soluções para o problema
A primeira solução para resolver o problema apresentado se encontra no artigo 263, parágrafo único, do CPP, que dispõe que “O acusado, que não for pobre, será obrigado a pagar os honorários do defensor dativo, arbitrados pelo juiz”. Este também é o entendimento majoritário da doutrina, ilustrado, por exemplo, na opinião de Renato Brasileiro de Lima[8], Pacelli/Fischer[9] e Lenio Streck[10], acolhido igualmente pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, que já emitiu recomendação no sentido de que a Defensoria Pública da União somente pode atuar nas hipóteses em que estiver caracterizada a insuficiência de recursos do defendido, de modo que “A garantia da defesa técnica nos casos de abandono ou retirada da defesa constituída, em que o réu não for pobre, deverá ser feita por defensor dativo, a ser remunerado pelo defendido, observado o disposto no artigo 263, do Código de Processo Penal”[11]. Sintetizando essa primeira solução: quando o acusado, tendo condições financeiras, não constituir advogado, o juiz deve seguir o artigo 263, parágrafo único, do CPP, e nomear um advogado dativo, que deverá ser pago pelo acusado.

Problemas desta solução: enfraquece o direito (irrenunciável, advirta-se) à ampla defesa e viola o direito de acesso à justiça penal, pois agride a experiência e a vivência acreditar que os advogados dativos prestarão um trabalho de qualidade sabendo que muito provavelmente não receberão os honorários ao final do processo. Ora, se o acusado não se dispôs a pagar um advogado de sua confiança, parece óbvio que criará todo tipo de obstáculo para — também — não pagar o advogado dativo. Os riscos de violação à ampla defesa atestam a improcedência desta solução, que tutela de forma ineficiente o direito fundamental protegido[12].

A segunda solução se parece com a primeira no que diz respeito à remuneração compulsória da assistência jurídica, mas aqui, porém, o trabalho seria desempenhado pela Defensoria Pública, que poderia cobrar, ao final, honorários do acusado não hipossuficiente, verba que seria revertida para um fundo institucional próprio. Neste sentido, confira-se a Resolução 85/2014 do Conselho Superior da Defensoria Pública da União (CSDPU), cujo artigo 6º, parágrafo 1º, estabelece que “A atuação na persecução penal independerá da necessidade econômica do beneficiário quando, na condição de réu, intimado para constituir advogado, não o fizer, e sobrevir nomeação judicial da Defensoria Pública da União”, esclarecendo o artigo 7º da mesma Resolução que “Nos processos criminais, se restar constatado que a pessoa natural ou jurídica não é necessitada econômica, deverá o Defensor Público Federal provocar o juízo criminal para o arbitramento de honorários, os quais passam a constituir fonte de receita do Fundo de Aparelhamento e Capacitação Profissional da Defensoria Pública da União”. Tal entendimento também foi acolhido pelo PLS 156/2009 (Projeto de...

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Didático, objetivo e beirando a excelênica. Parabéns, Dr. Caio Paiva! Texto de leitura obrigatória a todos os profissionais do Direito, em especial aos concursandos vocacionados às carreiras de Defensorias Públicas. continuar lendo