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23 de Abril de 2024

Prescrição quinquenal de dívidas tem diferentes interpretações no país

Publicado por Consultor Jurídico
há 9 anos

Existem obras do espírito humano que são consideradas clássicas, como os grandes textos literários, as músicas mais emocionantes e os quadros mais admirados. Até o futebol no Brasil tomou para si o conceito de “clássico” para designar as importantes partidas regionais.

Ítalo Calvino, no primeiro capítulo de seu livro intitulado Por que ler os clássicos, listou critérios para identificação de obras às quais se atribui essa qualidade, entre os quais: “Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado; mas constituem uma riqueza não menor para quem se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-los”; “os clássicos são livros que, quanto mais pensamos conhecer por ouvir dizer, quando são lidos de fato mais se revelam novos, inesperados, inéditos”; ou, ainda, “um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”.[i]

No Direito, evidentemente, há obras clássicas. São aquelas que, além de atender aos critérios acima indicados, não perdem a sua utilidade com o passar do tempo e proporcionam autoridade na argumentação jurídica por várias gerações de profissionais do Direito. No Brasil, exemplo disso é a obra de Carlos Maximiliano, intitulada “Hermenêutica e Aplicação do Direito”,[ii] de 1925 e reeditada até hoje, que trata de importantes aspectos da atividade de interpretação, entre os quais os métodos filológico, lógico, sistemático, teleológico e histórico. Por mais sofisticadas e refinadas que sejam as teorias contemporâneas sobre interpretação, as quais, inclusive, suscitam debates acalorados, não há como fugir do uso daqueles métodos na aplicação prática do direito no caso concreto.

Nos últimos tempos, tivemos um caso bastante curioso, decorrente da não-aplicação dos tradicionais métodos de interpretação do Direito.[iii] Trata-se da prescrição quinquenal da pretensão para a cobrança de dívidas, conforme disposto no artigo 206, parágrafo 5º, I, do Código Civil brasileiro, nos seguintes termos: “Artigo 206. Prescreve: (...) parágrafo 5º Em cinco anos: I – a pretensão para a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular”.

A prescrição, no Direito Privado, é a extinção da pretensão do credor à satisfação do seu crédito em razão da inércia na exigência de que o devedor cumpra com sua obrigação. É o que se estabeleceu no artigo 189 do Código Civil de 2002, ao dispor que “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, que se extingue pela prescrição, nos prazos a que aludem os artigos 205 e 206”.

O fato jurídico que enseja a ocorrência da prescrição, manifesta-se na dinâmica das relações privadas, nas quais o comportamento esperado é o adimplemento da obrigação. O credor tem a expectativa de que o devedor assim o fará, mas essa pode ser quebrada pelo inadimplemento. Ao credor resta tentar restabelecê-la, aguardando que o devedor cumpra a obrigação, ainda que em atraso, ou, então, que resolva, formalmente, exercer sua pretensão ao crédito. Considerando que o inadimplemento é fato indesejado pelo legislador, estabelecem-se prazos para que o credor tome uma atitude ou que se conforme com o inadimplemento, a fim de que relações jurídicas não continuem pendentes indefinidamente.

Parece condizente com os tempos atuais, para não usar o termo “sociedade pós-moderna”, que seja de cinco anos o prazo para que o credor exija do devedor o cumprimento da obrigação de pagar uma dívida constante de instrumento público ou particular. Afinal, tornou-se quase impossível não ser localizado — ou ser considerado juridicamente ausente — em razão dos avanços da informática, da telemática e da Internet, termos que se referem a aplicações distintas das tecnologias, ainda que aparentemente semelhantes. Todos os dias, dados pessoais são automaticamente coletados em grande quantidade e armazenados indefinidamente. Os salários são pagos mediante depósitos em contas bancárias. Produtos são comprados com cartões de débito e de crédito. Contas são pagas mediante boletos nos bancos ou em casas lotéricas. Por toda parte, o número do CPF ou do CNPJ é solicitado e anualmente se devem apresentar as declarações do imposto de renda, sob pena de tornar a inscrição em situação irregular, inviabilizando boa parte das relações jurídicas.

Ademais, houve praticamente a universalização dos serviços de telefonia móvel, de modo que quase todas as pessoas têm um número de telefone para contato. As redes sociais permitem a localização fácil de quem dela faz parte, mostrando, inclusive, com quem mantém relacionamentos sociais. Inclusive há casos em que se citou ou se intimou pelo Facebook ou pelo Whatsapp.[iv] Contra este estado de coisas, só restam as limitações do direito à privacidade e ao sigilo de dados e de comunicações.

Mas, na prática, nem sempre o que a lei dispõe com clareza — in claris cessat interpretatio — é interpretado da maneira mais adequada.

Por meio da interpretação sistemática em matéria de prescrição, constata-se que o legislador costuma adotar o prazo quinquenal para a prescrição da pretensão à cobrança de dívidas. O Código Tributário Nacional, no artigo 174, estabelece o prazo prescricional de cinco anos para cobrança do crédito tributário. A prescrição para a cobrança de créditos trabalhistas é quinquenal (CF/1988, artigo , XXIX e artigo 11 da CLT), a pretensão para a cobrança de honorários também é quinquenal (EOAB, artigo 25 e CC, artigo 206, parágrafo 5º, II) e o Código de Defesa do Consumidor estabelece, no artigo 27, o prazo quinquenal para a pretensã...

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