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20 de Abril de 2024

"Caminhamos a passos largos para o common law ", afirma Teori Zavascki

Publicado por Consultor Jurídico
há 8 anos

Por Pedro Canário

Caminhamos a passos largos para o common law afirma Teori Zavascki

Para o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, “nosso sistema caminha a passos largos para o common law”. Na opinião dele, cada vez mais a estrutura da jurisdição constitucional brasileira se estrutura em torno da valorização dos precedentes judiciais e da jurisprudência para além do que dita a doutrina clássica.

Common law é o modelo adotado principalmente no Reino Unido e nos Estados Unidos segundo o qual o Direito se desenvolve a partir de decisões judiciais e da formação de precedentes. Nesse modelo, portanto, o Judiciário também cria Direito: as sentenças devem se basear em decisões anteriores, mas também se aplicam a casos futuros.

O Brasil e quase todos os países da Europa continental adotam o modelo chamado de civil law, ou Direito Positivo. Isso quer dizer que o Direito é formado pelas leis e por atos do Poder Executivo, cabendo ao Judiciário apenas a aplicação da legislação e a arbitragem de conflitos.

No entanto, na opinião do ministro Teori, com o aumento do que ele chama de “eficácia expansiva das decisões judiciais”, o Direito brasileiro tem valorizado cada vez mais os precedentes judiciais. O ministro falou durante o 18º Congresso Internacional de Direito Constitucional, organizado pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).

“Não podemos mais dizer que decisões de eficácia erga omnes são apenas as que decorrem do controle concentrado de constitucionalidade ou da resolução do Senado que afasta a aplicação da lei declarada inconstitucional”, afirma. “Com a expansão do controle concentrado de constitucionalidade, a eficácia expansiva das decisões do Supremo se tornou natural, tanto para declarar uma lei inconstitucional quanto para declarar constitucional.”

Teori analisa também que a própria legislação, e não apenas a jurisdição, passou a valorizar mais os precedentes. Ele cita os exemplos da repercussão geral no Supremo e dos recursos repetitivos no Superior Tribunal de Justiça, que aplicam a definição dos tribunais aos casos já em andamento.

Subproduto

O ministro, no entanto, aponta que essa supervalorização da jurisprudência “criou um subproduto”. “Se a eficácia expansiva das decisões do Supremo tem se ampliado, o cumprimento dessas decisões pode ser exigido por meio de reclamação? Isso criaria um problemão, porque transformaria o Supremo em corte de competência originária para todos os fenômenos.”

Porém, Teori afirma que, na Reclamação 4.335, o Supremo decidiu que “a força expansiva das decisões não é vinculante, é persuasiva”. E aí entra a diferença entre as decisões de força normativa e as decisões de força executiva do STF, o que explica também a “prática corriqueira” do tribunal em modular suas declarações de inconstitucionalidade.

O primeiro caso, explica o ministro, são as decisões de controle constitucional de leis. A jurisprudência clássica do Supremo é de que, se uma lei é inconstitucional, o é desde que foi editada. Ou seja, leis inconstitucionais são nulas e, portanto, os efeitos da decisão retroagem — o grande voto contrário a essa percepção, conforme contou Teori na palestra, é do ministro Leitão de Abreu, para quem leis declaradas inconstitucionais são anuladas, o que faria com que a inconstitucionalidade passasse a valer a partir da data da publicação do acórdão, sem retroagir.

No entanto, a modulação se explica pela eficácia executiva. “O efeito vinculante é da decisão que declarou a norma inconstitucional, e não da própria norma”, diz o ministro. “O efeito vinculante, portanto, é sempre ex nunc. O efeito normativo é que se dá no ‘plano das ideias’, como escreveu Pontes de Miranda.”

Novas fronteiras

Teori explica que a jurisdição constitucional brasileira passa por um momento de mudanças, mas “de grande vigor”. Segundo o ministro, a própria definição clássica de jurisdição constitucional já não se aplica mais aos tempos atuais. “Não é apenas o controle da constitucionalidade das normas, ou do conflito de leis com a Constituição. É a relação das coisas, no sentido mais amplo, com a Constituição. Relaciona leis, atos, condutas e até a jurisdição com a Constituição.”

Como exemplos dessa “nova fronteira” da jurisdicional constitucional, Teori cita os tratados internacionais de Direitos Humanos. Desde a promulgação da Emenda Constitucional 45/2004, os tratados assinados pelo Brasil e ratificados por uma maioria de três quintos do Congresso têm status de norma constitucional. Os tratados assinados antes da emenda, ou não ratificados pela maioria qualificada, são, conforme a jurisprudência do STF, normas supralegais, mas infraconstitucionais. “Estamos diante de um novo domínio.”

“Portanto”, afirma Teori, “os tratados podem ser objeto de controle de constitucionalidade, mas também podem ser parâmetros para a jurisdição constitucional”.

Outra novidade é o que o ministro chamou de controle das práticas constitucionais. Ele citou o exemplo do julgamento da constitucionalidade da medida provisória que criou o Instituto Chico Mendes, ou ICMBio. Naquela ocasião, o Supremo decidiu que a MP não se enquadrava nos critérios de urgência que autorizariam a edição de uma medida provisória pelo governo, o que a tornou inconstitucional. O instituto, portanto, deveria ter sido criado por lei ordinária.

No entanto, depois de aparte da Advocacia-Geral da União, os ministros se deram conta de que, aplicando “a doutrina clássica da eficácia expansiva, declararia a inconstitucionalidade de centenas de medidas provisórias”, contou Teori. A saída, então, foi modular a decisão para que ela só valesse dali para frente.

O mesmo aconteceu com a proibição da inclusão de temas estranhos à ementa de MPs quando de sua conversão em lei pelo Congresso. Ou ainda quando o Supremo proferiu uma liminar para obrigar o Congresso a analisar os vetos presidenciais em ordem cronológica, sem se dar conta de que havia outros 3 mil vetos sem análise e que a prática dos parlamentares era a análise em ordem aleatória. A liminar foi cassada pelo Plenário e a decisão, modulada.

“São novos domínios da jurisdição constitucional ainda carentes de aprofundamento teórico”, sugeriu o ministro. Por fim, o ministro declarou que “a jurisdição constitucional se dá aos poucos, não se forma da noite para o dia e nem por ação de uma pessoa. É construção paulatina”. E fechou a palestra parafraseando Isaac Newton: “Que os de hoje vejam mais longe porque subiram nos ombros de gigantes”.

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Concordo com o sistema inglês, mas implantado em um Poder Judiciario composto de juízes de boa formação jurídica, em todas as instâncias, sem a infestação de políticos medíocres travestidos de magistrados, colocados nos mais altos postos da Justiça, com a missão de coverter os tribunais superiores em órgãos de política partidária. continuar lendo

Acrescentaria a pertinência de, como nos Estados Unidos, os Magistrados (muitos deles) contarem com mandato popular a os legitimar a criar leis.
Além da ressalva de ter-se que considerar que as constituições daqueles países são bastante sintéticas, o que mantém poder com o legislador, ao passo que a nossa elevou quase tudo ao patamar constitucional, o que, no contexto de neoconstiucionalistas que se imaginem déspotas esclarecidos, pode relegar o legislador a mero títere do que entende o Judiciário ser o princípio a aplicar a determinada situação - aliás, como se a Constituição decorresse de inspiração divina e tivesse passagens que nunca pudessem ser alteradas, mesmo contra a vontade do povo. continuar lendo

Perfeito! É isso mesmo. Para comprovar, bastaria que todas as decisões do Poder Judiciário fossem disponibilizadas na internet. Uma comparação das motivações com os dispositivos mostraria, de forma cristalina, o que o senhor acaba de afirmar. Sugiro, por exemplo, que entre no site do STJ e faça uma pesquisa nas ações rescisórias. Dependendo do caso, eles admitem reexame de prova, apresentação de documentos ditos novos e por aí vai. Somos brasileiros e, infelizmente, gostamos da hipocrisia. Não demoraria muito e apareceria alguém para dizer que a divulgação de tais decisões contrariariam algum dispositivo constitucional. E se formos para a seara trabalhista... humm... ai meu Deus... E, por favor, não sou empresário. Abr. continuar lendo

Sr.Edson, é desse seu entusiasmo contagiante que a Justiça necessita, para progredir e servir a sociedade, de forma atualizada e dinâmica, conforme todos desejamos. Eu já me aposentei, mas vocês jovens podem começar de onde paramos e utilizar os recursos técnicos modernos para atingir a meta objetivada. Boa sorte! continuar lendo

A ampla retórica a respeito e os inteligentes argumentos contrários, não afastam a realidade dos fatos.
O mundo virtual, on line, em tempo real, em que estamos nos convertendo, sem retorno, mesmo sob protesto dos tradicionalistas e lamúria dos saudosistas, não admite mais a ineficácia, seja qual for a força e sustentação do argumento contrário.

Entre as irracionalidades do nosso sistema positivo, vejo dois procedimentos que há décadas defendo e cuja adoção, certamente não resolverá o vácuo judicante de que o povo é carente, mas ajudará a acelerar minimamente o processo:
1.A commom law e
2. A fungibilidade dos processos e procedimentos.
Haveria mais um
3. A desjudicialização das questões corriqueiras de Estado.
Esta sim, o verdadeiro entrave e engarramento da Justiça.

Para o primeiro problema, a solução está à mão com a proposta de Teori. Seja qual for o subcontexto político em que seja colocada.
Para o segundo problema, o judiciário já tem timidamente feito ensaios, em especial nos processos eletrônicos, que se tornarão dominantes.
O terceiro problema ainda é um entrave de nosso estado colonial. Onde a coroa vale mais do que o coroado. A burocracia supera o cidadão.

De qualquer forma, precisamos mais Justiça e menos Judiciário.
Ou será um eterno aumento de quadros públicos, para cada dia menos prestação de serviços públicos.
Quem sabe um dia, poderemos até sermos todos funcionários.
Aí nada mais teremos a reclamar senão aumento de salário e diminuição do trabalho.
O Véio. continuar lendo

Óbvio que de nada adiantaria boa intenção, sem determinação para melhorar.contudo, justiça é tarefa para quem está preparado para proporciona-lá, não para rábulas, políticos posando de juristas e outros pretensiosos irresponsáveis, caso contrário retrocederemos ao absolutismo onde o governante administrava, legislava é julgava. A tripartição do poder estatal é importante conquista da democracia a qual não pode continuar sendo mera retórica para disfarçar a tirania. continuar lendo

Aparelharam, inclusive, o Judiciário. Fácil agora estabelecer a ditadura dos representantes do PT no STJ, STF e CNJ com a alegada common law que eles produzem.

Nem Hitler.

Adeus Juiz Moro! continuar lendo

Se preparem, porque se depender deles já já nos tornaremos a Venezuela. continuar lendo

Esse é o sonho e desejo dos magistrados.
Se transformarem em legisladores, mesmo indo de encontro ao nosso sistema.
Quer legislar, se candidate a cargo eletivo. continuar lendo

Isso é resultado dos seguintes problemas (lista não exaustiva):

- vácuo de poder;

- oposição ao governo inexistente;

- escolhas de alguns Ministros de Cortes Superiores relacionadas a viés ideológico e/ou político e com conhecimentos jurídicos duvidosos para essas funções;

- Legislativo omisso;

- Executivo omisso, fraco e esparro do Legislativo;

- classe média omissa e acomodada;

- imprensa desinformadora ("dolosamente");

- Constituição defensora de toda a sorte de desvios;

- povo desinformado ("dolosa" ou "culposamente"). continuar lendo