A confissão espontânea como circunstância atenuante no código penal
Decorridos mais de dois lustros da reforma penal promovida pela Lei 7.209, de 11-7-1984, ainda permanece acesa a controvérsia em torno da “confissão espontânea” como causa de atenuação da pena.
Este despretensioso estudo tem o único propósito de firmar convicção pessoal sobre a questão, que agasalha múltiplas facetas.
Na redação original do Código Penal, a confissão, que também se exigiu “espontânea” e prestada perante “autoridade”, deveria – para ser considerada circunstância legal – ser relacionada à autoria do crime, quando ignorada ou imputada a outrem (artigo 48, IV, d).
Assim, no sistema anterior não bastava o agente confessar espontaneamente o crime à autoridade, se sua autoria não fosse, até o instante dela, ignorada ou imputada a outra pessoa.
Em novo dispositivo, o legislador da minirreforma suprimiu a expressão “ignorada ou imputada a outrem”, de modo que, hodiernamente, as únicas exigências no âmbito da confissão, para se tomá-la como circunstância atenuante do crime, é que se relacione à autoria do crime, que seja espontânea e prestada à autoridade, assim considerados o juiz, o promotor e a autoridade policial.
O desate da questão passa inicialmente pela compreensão da expressão “confissão espontânea”, quanto ao sentido que se deve dar a ela para fins de reconhecimento da circunstância legal definida no artigo 65, III, d, do Código Penal.
Na interpretação do artigo 15 do Código Penal, a doutrina faz distinção entre ato voluntário e ato espontâneo, para informar que a desistência voluntária dispensa seja ela também espontânea, entendendo-se como tal aquela nascida da ideia e atitude do próprio agente, sem interferências externas.
Entretanto, não foi esse, evidentemente, o sentido que o legislador procurou conferir quando, na caracterização da circunstância legal da confissão como atenuante (CP, artigo 65, III, d), qualificou-a de “espontânea”.
O termo “espontaneamente”, grafado no texto legal, não pode ser compreendido como exigência de a confissão ser, necessariamente, fruto de ideia original do agente, senão como produto de sua vontade livre e consciente, de ausência de fatores externos que possam viciá-la.
O fato de a confissão ter nascido da sugestão ou de conselhos de terceiro não constitui empecilho a tomá-la como atenuante.
Que se pense na possibilidade de a mãe ou a esposa do agente ter mostrado a ele a necessidade de assumir seus erros, para início de uma vida redentora.
Nessa situação, mesmo que a confissão tenha sido plantada e germinada com base na ideia de terceiros, se processada e manifestada livremente, não se pode retirar dela seus efeitos na individualização da pena, podendo mesmo falar em direito subjetivo do réu em vê-la reconhecida[1].
Assim, é de somenos importância que provenha a confissão de ideia ou sugestão alheia, sendo suficiente seja ela resultado do querer do agente, desde que não viciado.
O que se procurou afastar foi a confissão tomada sob tortura, violências, pressões, constrangimentos, erros, fraudes, hipnoses, sob ação de drogas e outros expedientes que tirem ou turvem a livre manifestação do agente.
É nesse sentido que a Convenção Americana de Direitos Humanos, incorporada em nosso sistema legal por força do Decreto 678, de 6-11-1992, dispõe que “a confissão do acusado só é válida se feita sem coações de nenhuma natureza” (artigo 8.3).
Há ainda quem exija um sentido ético à confissão espontânea, ou mesmo sua utilidade para que seja ela aproveitável como causa legal de atenuação da pena.
De fato, sondando a doutrina, verifica-se que há quem reclame seja ela “completa e movida por um motivo moral, altruístico, demonstrando arrependimento”[2]; que deva “apresentar-se como um reclamo de consciência moral”[3]; que a autoria do crime ainda não seja conhecida ou que inocorra confirmação de indícios fortes dela[4]; deva ser “sinceramente desejada”, não sendo possível quando a intenção do ...
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