Médico deve fornecer prontuário requisitado pela polícia judiciária
Não se desconhece que o sigilo profissional encontra-se amparado no artigo 5º, X da Constituição Federal, assegurando a inviolabilidade da intimidade. O segredo profissional é extremamente importante para preservar confiança depositada em certas categorias e permitir o regular desempenho dessas funções, mantendo informações que toquem a esfera íntima e privada das pessoas a salvo dos bisbilhoteiros. É inquestionável que essa proteção, ao salvaguardar os elementos obtidos no desempenho da função, atende a um reclame de interesse público.
E sem dúvidas uma das principais manifestações do segredo profissional é o sigilo médico, elevado à condição de princípio ético fundamental dessa secular e importante carreira. Sua origem remonta ao juramento de Hipócrates, em 460 a.C., revestindo-se de caráter legal e deontológico. A relação médico-paciente é calcada na confiança, sendo o profissional da Medicina fiel depositário das informações de saúde do paciente.
Todavia, o sigilo médico-profissional, assim como os demais direitos, até mesmo aqueles que configuram cláusulas pétreas, não são absolutos, conforme pacífico entendimento dos tribunais superiores[1]. A existência de contravenção penal (artigo 66, II da Lei de Contravencoes Penais) para punir a omissão na comunicação de crime de que teve conhecimento no exercício da medicina reforça esse entendimento[2].
De outro vértice, tendo como norte a Constituição Federal, o legislador conferiu ao delegado de polícia uma série de instrumentos para possibilitar que cumpra de modo satisfatório sua missão constitucional de apuração das infrações penais.
Como já destacado anteriormente[3], um desses mecanismos é o chamado poder geral de polícia, hospedado no artigo 6º, III do CPP, que permite à autoridade policial colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias.
Dessa cláusula deflui o poder requisitório, abrangendo a possibilidade de exigir perícias e informações diversas, atribuição reafirmada pela Lei de Investigação Criminal (artigo 2º, parágrafo 2º da Lei 12.830/13).
Essa prerrogativa permite o acesso direto a uma série de dados não protegidos pela cláusula de reserva de jurisdição. E, dentre os dados que podem ser requisitados pela autoridade de polícia judiciária independentemente de autorização judicial, certamente estão aqueles contidos no prontuário médico.
Vale lembrar que não apenas a obtenção do prontuário hospitalar, mas diversos outros atos investigativos independem de prévia autorização judicial, tais como apreensão de objetos (artigo 6º, II do CPP), requisição de perícias (artigo 6º, VII do CPP) e ação controlada no crime organizado (artigo 8º, parágrafo 1º da Lei 12.850/13), situações em que o delegado de polícia pode e deve agir de ofício.
O que o sigilo médico protege é a revelação leviana, maldosa das informações médicas do paciente, e não aquela que visa a atingir o direito fundamental à segurança pública, tão importante quanto a intimidade do paciente e o regular exercício profissional do médico.
Não por outra razão, o Código de Ética Médica (Resolução 1.931/09 do Conselho Federal de Medicina), ao consagrar o sigilo médico, traz ressalvas. O princípio fundamental do sigilo é excepcionado pelos “casos previstos em lei” (capítulo I, inciso XI). E a vedação de revelação de segredo não alcança o dever legal, motivo justo e consentimento (capítulo IX, artigo 73).
Fica claro, outrossim, que a autorização do paciente não consiste na única hipótese a permitir o fornecimento do prontuário médico, como acreditam alguns.
Nota-se que mesmo a norma infralegal que dispõe sobre o sigilo médico não o faz de forma absoluta. Há exceções, o que significa que tal segredo pode ser mitigado, sendo exatamente o que ocorre numa investigação criminal por requisição do delegado de polícia.
Com efeito, o próprio Conselho Regional de Medicina de São Paulo[4] referenda a posição no sentido de que uma das situações de justa causa que relativizam o sigilo é justamente a investigação criminal, desde que não exponha o paciente a procedimento criminal.
E ainda que o dispositivo pretendesse tornar absoluto o sigi...
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