Jurisdição constitucional: a aproximação dos modelos americano e europeu
Em um primeiro momento, nesta coluna, destacou-se a importância de decisões judiciais como ferramenta de mudança constitucional. Após, o protagonismo do Supremo Tribunal Federal foi objeto de análise. Em razão de sua responsabilidade como guarda da constituição, o Supremo Tribunal Federal tornou-se protagonista de diversas mudanças na vida social, política e cultura brasileira. Cumpre, antes da abordagem pontual das decisões do Supremo, delinear o modelo brasileiro de controle de constitucionalidade, cuja particularidade está na combinação entre as tradições norte-americana e europeia do judicial review.
Símbolo crasso do constitucionalismo liberal que emergiu das revoluções burguesas do século XVIII, a constituição dos Estados Unidos exerceu grande influência, principalmente na América, na qualidade de expressão e de cristalização do poder constituinte do povo em um documento escrito, o que lhe conferia um status supralegal per se. Por ocasião do julgamento de Marbury v. Madison, consolidou-se o modelo americano de controle de constitucionalidade, que atribui à Suprema Corte dos Estados Unidos a competência de interpretar as normas jurídicas à luz da constituição a partir de um caso concreto, qual seja, o direito de William Marbury a tomar posse na magistratura, e sem eficácia erga omnes, ou seja, com efeitos restritos às partes.
O modelo de controle de constitucionalidade norte-americano consolidou-se como incidental e concreto, ou seja, tribunais estaduais e federais de qualquer hierarquia são responsáveis por aferir a constitucionalidade da lei. Se julgar inconstitucional a lei, poderá afastar sua incidência no caso concreto, com efeitos tão somente intra partes. Apenas em última instância e não sem diversos filtros, o Tribunal Constitucional pronuncia-se sobre a lisura da lei, proferindo decisão que orientará aos demais juízos na resolução de controvérsias semelhantes — em outro termo, proferindo uma stare decisis.
Assim como a constituição norte-americana, cujo texto não estipula expressamente o controle de constitucionalidade, a primeira constituição brasileira não previu forma alguma de controle de constitucionalidade, muito em função da existência do “Poder Moderador” da Constituição Imperial. Em 1891, reconhecendo a realidade existente desde a edição do Decreto 848/90, que instituiu expressamente, entre as competências do Supremo Tribunal Federal, a avaliação da validade de norma ou ato à luz da Constituição, a primeira constituição republicana acolheu o controle difuso e incidental, sob a influência da Constituição dos Estados Unidos.
Com 1891, veio um modelo de Justiça dual, que permitia tanto à Justiça Federal quanto à Justiça estadual declarar incidentalmente a inconstitucionalidade das leis, em suas respectivas esferas de atuação, quando suscitada a questão nos casos concretos. Os efeitos das decisões somente seriam oponíveis intra partes, o que permitia interpretações distintas e até díspares sobre uma mesma lei. A codificação do Direito brasileiro, herança da tradição jurídica do civil law, foi em parte o motivo da não recepção do precedente obrigatório na prática jurídica nacional.
A Constituição brasileira de 1934 preservou o sistema incidental e difuso norte-americano, mas introduziu mudanças significativas, como a possibilidade de o Senado Federal suspender total ou parcialmente a execução de lei, ato, deliberação ou regulamento considerado inconstitucional pelo Poder Judiciário, semelhante à compreensão americana do stare dec...
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