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27 de Abril de 2024
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    Contra a Covid-19, não há direitos?

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 4 anos

    A curva da doença precisa ser achatada. A Constituição, não.

    O título é uma provocação. Trata-se de um trocadilho de uma frase que estava escrita numa placa na entrada do Doi-Codi de São Paulo, na década de 1970, que tinha os seguintes dizeres: “Contra a pátria, não há direitos”. Aos poucos, especialmente depois da inédita sentença de condenação da União, em decorrência da morte do repórter Vladimir Herzog, mostrou-se que há limites para o exercício do poder soberano do Estado.

    A redemocratização do Brasil trouxe consigo a consagração do constitucionalismo e a teoria dos direitos fundamentais, que, segundo aprendemos, é o núcleo intangível da Constituição representativo dos valores mais caros da sociedade, não sendo passíveis de supressão ou alteração sequer por emenda constitucional. É um limite ao arbítrio, tão cobrado para a superação do período anterior ou pelo menos deveria ser.

    A referência, no título do ensaio, ao governo dos militares, tido como revolucionário por uns ou como golpistas por outros, é também outro assuntos que voltou a ser revisitado, seja pela tentativa de implementar uma justiça de transição no Brasil, obstada por decisão do STF na ADPF 153, seja pela eleição democrática de 2018, que legitimou, como mandatário máximo, um representante que, dentre suas virtudes, está a transparência de suas posições e opiniões, gostemos delas ou não, inclusive sobre o período militar, que cessou com a Constituição de 1988, que rege o país desde então.

    A Constituição revelou-se, naquela eleição, a mais pluralista possível, albergando o respeito à liberdade de expressão e de pensamento. Mas, a Constituição tem sua maior importância, inclusive nos períodos acentuados de crise, na defesa de posições contramajoritárias, que nem sempre estão de acordo com o discurso do “politicamente correto. Aliás, o professor Elias Thomé Saliba, titular de História da USP, ensina que “(o politicamente correto) é uma criação ideológica característica de sociedades que perderam o norte dos padrões morais e acabaram por impor regras casuísticas tópicas, que só conseguem estabelecer limites arbitrários. Batizado com outros nomes ou disfarçado de alguma forma de censura, o ‘politicamente correto’ sempre existiu em sociedades que viveram momentos distópicos, quando a ausência de cenários futuros deixou de ensejar padrões morais estáveis. O resultado é um moralismo nervoso que se manifesta aqui e ali, meio esquizofrênico, tópico, que não sabe bem a que veio e, na história, nunca resultou em boa coisa”

    A Constituição, por mais incrível que possa parecer, agora sofre sua maior ameaça, que não decorre de uma crise política, mas de uma causa biológica: o coronavírus, patógeno invisível que afetou o equilíbrio federativo e as relações de poder. As medidas adotadas em âmbito regional e local, segundo pesquisas, encontram apoio popular majoritário[1], que mostram que as maiorias se formam ocasionalmente e, por isso mesmo, não são o porto seguro para adoção de medidas requeridas pela crise.

    Chamou a minha atenção o fato de o presidente da República Jair Messias Bolsonaro, nessa sexta-feira da paixão, passear pelas ruas da capital federal, sendo massivamente criticado pela imprensa, que o classificou como delinquente social e irresponsável[2], diante das regras de governadores de estados que limitam a liberdade das pessoas e a atividade econômica. Mas, apesar da crítica ferrenha, outro fato despertou a minha atenção a frase do presidente: “Ninguém vai cercear meu direito de ir e vir”.

    A meu ver, a Constituição Federal, na qual se devem buscar as soluções sobre a crise, estava ao seu lado.

    O gesto do presidente, evidentemente, tem significados políticos. Mas, sua frase e, mais do que ela, seu direito, sob o ponto de vista jurídico, que é o objeto de minhas reflexões, se ampara na tradição jurídica secular, da Carta Magna de João Sem Terra, às Revoluções Francesa e Americana. A Constituição precisa ser respeitada e somente a partir dela é que se constroem soluções para a crise.

    Entre direitos, deveres e desejos, a Constituição é o caminho necessário. Mas não é o que está se passando.

    Embora se diga, sem maiores reflexões, que situações excepcionais devem ser tratadas de forma excepcional, não se pode perder de vista que a solução para a crise e os desafios jurídicos que ela provocou devem ser encontrados na centralidade da Constituição no sistema jurídico. Atualmente, o remédio constitucional para a emergência é o estado de defesa e o estado de sítio (artigos 136 e 137 da CF), a menos que seja criado um novo regime de exceção, um estado de pandemia, o que novamente depende da iniciativa qualificada de lei, no caso, um projeto de emenda à Constituição.

    A liberdade de ir e vir (artigo , XV, da CF) e as obrigações de fazer ou deixar de fazer determinado comportamento (artigo , II, da CF), são uma conquista histórica sobre o arbítrio. Segundo o professor André de Carvalho Ramos[3] “essa sintonia entre liberdade e, legalidade é fruto da consagração do Estado de Direito. Fica superada a submissão de todos à vontade dos monarcas, substituída pela vontade da lei”.

    A Lei da Quarentena, a Lei 13.979/2020, permitiu o isolamento e quarentena no Brasil. Mas a lei permite apenas, no isolamento, a “separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do...

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/contra-a-covid-19-nao-ha-direitos/830135023

    1 Comentário

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    Pena que as pessoas não têm consciência de que os incisos XV e XVI do artigo 5 da Constituição só perdem os efeitos em caso de estado de sítio ou de guerra, decretado APENAS pelo Presidente da República.
    Não entendo como as pessoas ficam acovardadas frente aos protótipos de ditadores -municipais e estaduais. continuar lendo